Inventário – Edificações não averbadas na matrícula do imóvel – Princípio da Cindibilidade
Texto Atualizado em 12/03/2016
Dr. Rogger Carvalho Reis
OAB/ES 20.672
Em alguns casos o terreno que serve de base para a casa dos pais, também serve para fundação da casa dos filhos, e até dos netos, ocorrendo o fenômeno da aglomeração, ou seja, quando tais construções aglomeram-se sob a mesma matrícula imobiliária sem as devidas averbações.
É importante ressaltar que para realizar uma averbação de obra na matrícula do imóvel é necessário cumprir um processo administrativo junto à Secretaria de Obras do município onde se encontra o imóvel. A par desse processo o interessado vai obter os documentos que autorizam a construção, que registra o início e o fim da obra e que libera para ocupação após vistoria dos bombeiros.
Não obstante, além dos referidos documentos (alvará, habite-se, certidão de obra) será necessário extrair a certidão de tempo de cadastro do imóvel, nela deve constar um histórico das transformações sofridas pelo edifício.
De posse desses documentos, o interessado na averbação do registro deverá realizar um procedimento administrativo junto a Receita Federal, para regularizar o pagamento das contribuições incidentes sobre a mão de obra empregada na obra do imóvel, que é chamado de DISO.
Após realizar o pagamento das contribuições e de posse da certidão negativa de débitos, somado a todos os documentos anteriormente relacionados, o interessado deve encaminhá-los ao Cartório de Registro de Imóveis, para realizar a averbação na matrícula imobiliária.
Esse enorme procedimento que inicia na Prefeitura, vai para a Receita Federal e termina no Cartório de Registro de Imóveis, deve ter o custo médio de 30% do valor do imóvel, ou até mais, pois os custos do cartório variam de acordo com a tabela do seu respectivo Estado. Em relação ao tempo de duração, o caso pode levar mais de 2 anos para se concluir. Quem pretende regularizar um imóvel precisa estar ciente dessas questões.
O processo de Inventário é utilizado para realizar a transferência de propriedade adquirida com a herança, ou seja, materializa a transferência de propriedade pondo o nome do herdeiro na classificação de proprietário de determinado imóvel.
Não obstante, quando o caso trata-se de um inventário de um terreno com construções que não foram averbadas na matrícula do imóvel, há precedente aplicando o princípio da cindibilidade possibilitando a partilha da herança em primeiro momento, e transferindo para posteriori a necessidade de plena regularização imobiliária.
O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo acompanha o precedente sem ressalvas:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. TERRENO. EDIFICAÇÕES NÃO AVERBADAS NA MATRÍCULA DO IMÓVEL EM QUESTÃO. EXIGÊNCIA FEITA PELO ÓRGÃO JUDICIAL DE PRÉVIA AVERBAÇÃO DAS CONSTRUÇÕES. DESNECESSIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CINDIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. I-Não bastasse o custo elevado da averbação determinada, é cediço que para a sua realização é exigido o habite-se das construções, com a subsequente apresentação de projetos de engenharia (elétrico, hidráulico, entre outros), ou seja, requisito de difícil cumprimento pelas famílias humildes que constru- íram suas casas sozinhas, sem o emprego de mão-de-obra assalariada. II-Não obstante a realidade jurídica do registro deva se conformar com a realidade física do imóvel, afigura-se viável o registro da partilha ainda que não se averbe a construção. A uma, porque exigências quanto ao acessório (a acessão) podem acabar impedindo que tenha a necessária publicidade a mutação jurídico-real relativa ao principal, consistente na transferência da propriedade ocorrida causa mortis. A duas, porque a hipótese é de aplicação do princípio da cindibilidade do título, com o registro da partilha, promovendo-se a averbação da construção em momento posterior. III-O fato de se realizar a partilha sem a averbação das construções não traduz chancela do Poder Judiciário na manutenção de irregularidade registral omissiva. Ao contrário, apenas se estará possibilitando a necessária transmissão do imóvel aos herdeiros sem o óbice de exigência quase intransponível para as pessoas de poucos recursos, contribuindo-se, assim, para a regularidade registral, ainda que parcial. Recurso provido. CONCLUSÃO: ACORDA O (A) EGREGIO (A) QUARTA CÂMARA CÍVEL NA CONFORMIDADE DA ATA E NOTAS TAQUIGRÁFICAS DA SESSÃO, QUE INTEGRAM ESTE JULGADO, POR MAIORIA DE VOTOS, DAR PROVIMENTO AO RECURSO. (TJES, Classe: Agravo de Instrumento, 0010765-76.2015.8.08.0011, Relator: JORGE DO NASCIMENTO VIANA, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 30/11/2015, Data da Publicação no Diário: 16/12/2015) (Segredo de Justiça – acesso negado ao inteiro teor)
Princípio da Cindibilidade
No antigo sistema de transcrição das transmissões vigorava o princípio da incindibilidade dos títulos, ou seja, se a escritura formalizasse a alienação de vários imóveis, todos esses deveriam ser transcritos no Registro de Imóveis sob a mesma numeração e se algum imóvel por qualquer motivo não estivesse apto à transcrição, prejudicaria o acesso dos demais.
Atualmente o entendimento é diverso, graças a sistemática adotada pela Lei6.015/73. Nesse sentido já se posicionou o Conselho Superior da Magistratura, conforme, Ap. Cív. Nº 2.642-0-São Paulo, in DOJ de 24 de novembro de 1983. “Isso porque só aquele sistema da transcrição dos títulos justificava não se admitisse a cisão do título, para considerá-lo apenas no que interessa.” Vale dizer que hoje é possível extrair só o que comporta inscrição, afastando-se aquilo que não puder constar do registro, por qualquer motivo, como quando, eventualmente, houver ofensa à continuidade registrária. “Na verdade, com o advento da Lei de Registros Publicosde 1973, e, consequentemente, a
introdução do sistema cadastral, que até então não havia no direito registral brasileiro, a cindibilidade do título passou a ser perfeitamente possível e admitida”.
Logo, é possível concluir que existe viabilidade no pedido de regularização de um imóvel dentro de um terreno com várias propriedades e também seria possível pedir a conclusão da partilha antes da regularização imobiliária, conforme leciona Malheiros, Direito Administrativo Brasileiro, 23ª edição, Editores, pág. 85. Corrobora no mesmo sentido a jurisprudência, Ementa: arrematação independentemente da regularização da construção (Apelação Cível Nº 52.723-0/5; São Vicente; DOE 29/11/99).
Um cuidado a ser observado pelo registrador imobiliário é sempre exigir a anuência do apresentante ou mesmo contratantes para a aplicação do princípio da cindibilidade quando a situação assim determinar.
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