Em 1994, quando Fernando Henrique Cardoso foi eleito presidente da República pela primeira vez, escrevi um texto com o título de “Planejamento familiar”, que fez parte de um documento maior intitulado “Se eu fosse presidente”.
Abordei a proibição de mulheres e homens realizarem laqueadura e vasectomia pelo Sistema Único de Saúde – SUS. Passaram-se 21 anos e os problemas continuam praticamente os mesmos.
Houve diminuição na quantidade de filhos por casais. Em contrapartida, os jovens passaram a ter filhos ainda mais novos do que antes. Não é considerado que os casamentos hoje têm prazos de validade curtos. As pessoas continuam não se estruturando para casar ou para ter filhos. Mais do que antes, os adolescentes não precisam de autorização dos pais para trazer as namoradas para suas casas. Mais rápido ainda são aqueles que trazem para casa de forma definitiva após o encontro numa balada. Os filhos vêm fruto da irresponsabilidade da primeira noitada, sem preocupação com as condições materiais para cuidar, nem com o caráter do outro, muito menos com a própria saúde. Os problemas como a violência doméstica e de abusos sexuais contra filhos que já existiam são rotineiros e de conhecimento público.
Não existe razão única para a perpetuação de problemas sociais. Muitas variantes ajudam, o que dificulta identificar a raiz e o remédio eficaz para a cura.
Na “fabricação” desenfreada de filhos a qualquer custo, uma das mais complicadas é a glamourização do “ter filho” nas camadas sociais mais pobres e ter isso como sinônimo de felicidade plena.
Qualquer demonstração de infelicidade de quem não procriou é associada a essa falta, a esse vazio. O inverso é proporcionalmente verdadeiro: só é feliz plenamente quem tem filho.
É comum se ouvir que “agora estou plenamente realizada”, quando se constata uma gravidez, mesmo precoce, mesmo do décimo filho e dentro de uma situação de absoluta pobreza. Mesmo desempregados, sem um plano de saúde e até sem uma casa para morar não pesam na busca da felicidade épica.
Se uma pessoa opta por viajar, frequentar restaurantes, parques de diversão, em vez de fazer mamadeira ou limpar cocô de criança, é vista como dissimulada. Afinal, como alguém pode fazer uma opção tão absurda dessas!
Não há nada de errado no fato de cada um fazer da sua vida o que bem entender. Erro está nas consequências posteriores. E a responsabilidade nunca é atribuída a quem deu causa. É sempre dos governos e da sociedade.
Um bom começo para barrar essa “fabricação” de filhos seria quebrar a glamourização inconsequente, mencionar a trabalheira e dor de cabeça que filhos trazem e jamais difundir a ideia de que só é feliz quem tem filho.
Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
Bacharel em direito