O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi o convidado do ‘Mariana Godoy Entrevista’ desta sexta-feira (27). FHC afirmou que o atual governo não pode fazer um “pacto com o demônio” para se salvar e disse que o ex-presidente Lula “não tem mais essa capacidade de atração, pois o seu partido está muito envolvido com os escândalos de corrupção”.
Sobre as indicações para a Petrobras, Fernando Henrique falou que certa vez recusou Eduardo Cunha para a presidência da estatal. FHC disse que sente “preocupação pela democracia do Brasil”, e que o problema vai muito além da eleição de Cunha. Fernando Henrique disse que vetou o nome do atual presidente da Câmara porque já tinha conhecimento do político desde os tempos do presidente Itamar Franco, quando, segundo FHC, já havia “alguma” suspeita com relação ao nome dele. “Você tem que resistir às pressões quando elas são indevidas”, analisou.
“As pessoas não são nem só boas nem ruins, depende da circunstância. (…) Acho errado imaginar que os políticos todos são “um bando de não sei o que”. Eles representam o povo brasileiro”, definiu o ex-presidente. “O povo também erra. Veja no atual caso…”, cutucou Fernando Henrique.
Falando sobre a atual situação de Dilma Rousseff, o ex-presidente, que não é contra o impeachment, cita o caso de Fernando Collor: “Você não pode ter como objetivo o impeachment. Acontece que, diante de fatos, você não tem alternativa, você tem que fazer o impeachment”.
“Eu acho que a presidente Dilma, quando reeleita, já sabia da situação que o Brasil estava. Ela já errou ao não convocar todos em uma coesão ao redor dela. Continua numa posição de nós e eles. (…) Não é que ela errou no começou, ela continua errando, se isolando. (…) O impeachment tem que analisar o erro, lá no Congresso. E olha que tragédia, quem escolhe é o Cunha”, afirmou.
Mariana perguntou se nem um “pacto com o demônio” salvaria o atual governo, para o que Fernando Henrique respondeu: “Pacto com o demônio nunca salvou ninguém, vai para o inferno”.
Sobre o caso de Paulo Francis, que foi processado pela Petrobras por um texto onde questionava a corrupção da estatal, Fernando Henrique disse que o jornalista “não tinha um elemento de comprovação”.
Questionado sobre as críticas ao governo do PSDB, de que os casos “não andavam”, o ex-presidente disse que essas acusações “não tinham base”. Segundo FHC, estes processos não seguiram pois “não havia crime”.
Fernando Henrique disse que admira “explicitamente” o trabalho do juiz Sergio Moro e dos investigadores da Polícia Federal que comandam as investigações da Operação Lava Jato. No entanto, o ex-presidente destacou que Dilma deveria ser mais investigada pela compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos.
Sobre a doação de empresas para campanhas políticas, Fernando Henrique disse que a proibição vai trazer “a volta do Caixa 2”. “Deve-se acabar a marquetagem da campanha, diminuir os gastos da campanha. O partido já tem dinheiro público, a televisão é paga pelo converso. Proibir doações de pessoas até certo ponto. E deve-se proibir que doe dos dois lados. Seria favorável a doações mais realistas. (…) A campanha custa dinheiro, quem vai pagar? Só o governo?”, analisou.
O jornalista Eric Klein trouxe as perguntas do Twitter. Os espectadores queriam saber da história de que o PSDB teria comprado votos para garantir a legalidade da reeleição: “Claro que houve essas denúncias. Mas não foi culpa minha, não foi PSDB, e mandamos apurar. (…) A população era a favor, os jornais eram a favor, e eu ganhei a eleição. Isso foi uma tentativa do PT tentar ‘timbrar’ o assunto.”
“Eu quero ver quantas pessoas têm coragem de abrir o jogo”, disse o ex-presidente sobre a atualidade de seu livro.
O ex-presidente disse que não se arrepende do decreto que liberou a Petrobras para receber licitações. “Ou você libera sua empresa para competir com empresas internacionais ou você quebra ela”, justificou. “Você não resolve essas questões de corrupção sem fiscalização. E não houve fiscalização, houve um relaxamento de todos os controles. Não havia controle de nada, havia combinação prévia”, disse Fernando Henrique.
“Eu não acho que [o PT] acabou, ou deva acabar. O PT é um partido que fez muita coisa, coisas importantes”, disse o ex-presidente. Sobre o mensalão, Fernando Henrique ressaltou que “não houve frouxidão” nas investigações, mas que o povo “balanceou e achou que estava bem”. “Talvez não houvesse a massa de informações que existe hoje, eles não recebiam a informação como hoje”, disse. “Acho que o PT vai ter que se regenerar primeiro”, concluiu.
Fernando Henrique disse que o PSDB deve ser a “convergência” do que é necessário fazer no Brasil hoje. “Democracia do povo não é simplesmente votar, é o comportamento do povo”, destacou o ex-presidente. FHC disse que o partido não tem medo de que o ex-presidente Lula se candidate: “Lula não tem mais essa capacidade de atração, pois o seu partido está muito envolvido com os escândalos de corrupção de atualmente e ele não pode fugir disso”, afirmou. “Hoje ele representa coisas diferentes”.
FHC revelou que não se candidataria novamente. “Uma pessoa de 85 anos não tem a condição de viver essa vida que eu vivi”. O ex-presidente disse ainda ser a favor de um regime parlamentarista.
Fernando Henrique opinou que “o importante não é se privatizar estatal”, no caso da Petrobras, mas, sim, a concorrência. “A questão da Petrobras é que ela acabou com a concorrência. No pré-sal, a concorrência não veio pois sabia que a Petrobras iria controlar tudo”, analisou.
Sobre a tragédia em Mariana (MG), cujo rompimento da barragem destruiu cidades e o meio-ambiente, Fernando Henrique comentou a privatização da Vale do Rio Doce: “O governo continua tendo uma presença grande na Vale. Não foi em consequência disso que aconteceu [a tragédia] em Mariana”. Fernando Henrique cita relatórios que já apontavam para falhas estruturais e alertou para a falta de fiscalização. “Quando você privatiza, é necessário ter empresas fiscalizadoras”, analisou.
Chamado de “um verdadeiro estadista” pelo ex-presidente norte-americano Bill Clinton, Fernando Henrique definiu: “Uma pessoa que olha o Estado tem que ver o amanhã, não o hoje. (…) No caso de Mariana, os órgãos de fiscalização estão minados.”
Sobre as prisões recentemente feitas na Operação Lava Jato, de José Carlos Bumlai, o banqueiro André Esteves e o senador Delcídio do Amaral, FHC disse: “É dramático, é triste ver isso, pelas repercussões. A bolsa caiu 3%. A consequência pro povo é o desemprego, é a falta de confiança”.
Por fim, o ex-presidente completou: “A população hoje quer isso, quer sinceridade. Abram o jogo”.