No primeiro mandato de Lula, levantou-se a lebre do Impeachment. O escândalo domensalão havia estourado. O governo comprava votos no Legislativo. Corrupçãoclara, comprovada e resultando em prisões.
A oposição, no entanto, não levou adiante a ideia. A Nova República estava engatinhando, apenas FHC tinha conseguido levar um governo a termo. Umimpeachment seria sinal de grande imaturidade democrática.
Ademais, todos os principais nomes do PT da época, os homens de frente do governo Lula, tiveram de ser queimados: Dirceu, Genoino, Palocci (esse nem precisou do mensalão). Com o PT tão manchado, Lula acabaria não sendo reeleito, não é? Foi o que a oposição pensou na época.
Lula foi reeleito. E, tendo perdido todos os prováveis sucessores, inventou alguém do nada e a elegeu também. Duas vezes.
No primeiro mandato de Dilma, sete ministros foram demitidos por corrupção. Seguindo o exemplo de Lula, Dilma foi queimando quem precisasse, para se blindar.
Na época, a presidente contou com um voto de confiança da opinião pública. Ela havia dado sinais de que teria um governo com cara própria, que talvez não fosse apenas um fantoche de Lula, e demitir os acusados pareceu reforçar isso.
Era a tese de que seria implacável contra a corrupção, afastando, inclusive, ministros contra quem não havia provas definitivas. Estava certa. Queria um governo limpo, era essa a mensagem.
E então, veio a Lava Jato. Hoje sabemos, com certeza, que houve um esquema montado com participação direta do governo para desviar bilhões da Petrobras (e isso porque, por enquanto, só sabemos desta).
Boa parte desse dinheiro, pelo que apontam as evidências, foi canalizado para o próprio Partido dos Trabalhadores, ajudando a financiar a campanha de Dilma.
O escândalo tem dois protagonistas na esfera pública: a Petrobras e o governo comandando pelo PT.
Dilma foi presidente da Petrobras na época em que o esquema funcionou. E é a chefe do governo hoje, a presidente da República.
Precisamos acreditar que ela não esteve envolvida em nada. Dilma demitiu ministros por muito menos. Se ministros têm uma chefe que pode demiti-los, a presidente também tem: nós, o povo.
Quem apoia o governo parece que não se incomoda com isso. Festeja. O partido que governa para o povo, que melhora a vida do pobre, pode tudo. Rouba, mas faz.
Esse argumento é superficial. Não é o “rouba, mas faz”, simplesmente, que alimenta o continuado suporte ao governo petista. O argumento mais complexo passa por duas etapas.
Primeiro: uma vez que a corrupção é endêmica, acusa-se que os escândalos vieram à tona como um mecanismo golpista. A elite, frustrada por ter perdido o poder, revela a corrupção que sempre existiu, para derrubar o governo popular. Cabe ao povo, portanto, perdoar que o governo roube, para que a elite não volte ao poder.
Segundo: para este governo popular, a república democrática é uma farsa. Vencer as eleições é uma alegoria, uma metáfora, um instrumento. A revolução não rolou, mas tudo bem. Vamos brincar de eleição. Vamos fazer campanha por votos. Vamos nos aliar aos partidos fisiologistas. Vamos garantir para todo mundo que as propinas continuarão fluindo. Vamos convidar os banqueiros, empreiteiros, especuladores de terra, todos para a festa da democracia popular. Concorrer em eleições democráticas é tão sujo quanto a corrupção. Mas não importa, estamos só jogando o jogo, mecanicamente fazendo os movimentos requeridos para que essa dança funcione. Tudo bem. O que importa é o que povo chegou ao poder. Os fins justificam os meios.
Se esse argumento lhe convence, não há nenhum contra-argumento possível. Para quem pensa assim, Dilma deve continuar no Planalto.
Resta saber se é isso que o Brasil quer para si, enquanto constrói sua Nova República.
A eventual saída de Dilma não significa o fim da luta por um governo que olhe para os mais necessitados, que promova justiça social, que seja progressista e inovador. Todos os brasileiros continuarão votando, e continuarão podendo escolher os caminhos que queremos seguir como sociedade.
A manutenção de Dilma, no entanto, significa o fim da luta por um governo ético, que respeite e promova os ideais democráticos e republicanos que pensávamos estar construindo desde a redemocratização. Manter Dilma no poder é dar o aval de que, desde que agrade ao povo, o governo pode tudo.
É esse tipo de democracia que queremos?
Fonte: Brasil Post.