Desequilíbrio da coluna e pressão alta levaram a comerciante Elizabete Colombo, 51 anos, a arrendar sua lanchonete no Setor 5 em Ariquemes, a 200 quilômetros de Porto Velho. Viúva, mãe de dois filhos, pesando 118 quilos, ela recebe orientações de uma nutricionista e uma psicóloga do Hospital de Base Ary Pinheiro há um ano e oito meses.
“Não vejo a hora de fazer a cirurgia”, desabafou, minutos antes da reunião do grupo com a psicóloga do Programa de Cirurgia Bariátrica no HB, Rose Britto.
Até o final de dezembro, 229 pessoas inscreveram-se para cirurgias de perda de peso e redução do estômago. Atualmente, a média brasileira de espera na fila do serviço público de saúde é de pelo menos cinco anos, a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) espera baixá-la para três. “No prazo de dois anos essa meta será possível”, anunciou o médico cirurgião bariátrico Oziel de Moura.
Nova licitação na Sesau aumentará de duas para quatro as cirurgias bariátricas semanais no HB. O índice de obesos entre os maiores de idade no País é de quase 18%, o que corresponde a mais de 37 milhões de brasileiros.
O bypass gástrico para emagrecer, conhecido por by-pass em Y de Roux ou cirurgia de Fobi-Capella, é um tipo de cirurgia bariátrica que pode levar à perda de ate 70% do peso inicial.
Elizabete Colombo se confessa ansiosa para reduzir o peso e retomar o trabalho. Emagreceu um pouco no segundo semestre de 2015, mas ganhou peso no Natal e ano novo. “Minha vida é de casa para a rodoviária, e de lá para o hospital aqui em Porto Velho, três vezes por semana, porque depois da endoscopia, o médico descobriu uma bactéria; agora eu aguardo o resultado dos novos exames”.
Reativado em 2014, o programa fez 26 cirurgias em 2015. Em dez anos, de 2005 a 2015, fizera 63. “Mais do que em dez anos”, observou a diretora adjunta do HB, psicóloga Joelma Sampaio do Nascimento.
Na cirurgia de banda gástrica, nenhuma parte do estômago é removida e o processo digestivo permanece intacto. Ou os grampos e uma banda são utilizados para separar o estômago em duas partes, uma das quais é uma pequena bolsa que pode conter cerca de um grama de alimento.
A comida a partir deste “novo” estômago se esvazia para a parte fechada-off do estômago e, em seguida, retoma o processo digestivo normal.
Ao se alimentar com uma pequena porção de alimento há a sensação de se ter comido um grande volume. Após a cirurgia pode-se comer de tudo em pequenas quantidades, porém, uma “mordida” além do necessário pode causar náuseas, vômitos ou mesmo dor. A perda de peso em um ano varia de 30 a 40% do peso inicial.
“A VIDA MUDA MUITO”
Atualmente, essa cirurgia é a única opção que efetivamente trata a mórbida obesidade em pessoas para as quais não têm sido eficazes medidas mais conservadoras: dieta, exercícios e medicação.
A estudante de contabilidade Lidiane Bernardes Ferreira, 32, mãe de um casal de filhos, chegou a 106 quilos, submeteu-se a todos os exames, faz reeducação alimentar desde 2008 e se sente “preparada”.
A estudante de serviço social Fabiane da Silva Alencar, 31, casada, pesava 135 quilos e reduziu-os para 90 após a cirurgia feita em julho de 2015. Elogiou a nutricionista e a equipe multiprofissional que cuidou dela desde o momento da inscrição. “A vida muda muito, eu tenho vontade de fazer mais coisas, entrei na academia [de ginástica] e comprei roupas em conta nas três lojas especializadas em Porto Velho, algo que antes me saía bem mais caro”.
Fabiane teve crise de vesícula e teve que retornar ao hospital para o tratamento, entretanto, não tem mais colesterol, nem índice elevado de glicemia. Consome colágeno [proteína essencial para pele, músculos e cabelos] e faz reposição de vitaminas. Na academia, cuida-se para não comprimir o abdômen. Sonho de consumo? “Roupas bonitas, conclusão do curso e a cirurgia reparadora no tecido dos braços, que sei, ainda demora um pouco”.
Com duração de 18 meses, o período pós-operatório impõe rigoroso acompanhamento psicológico, clínico, cardiológico, endocrinológico, pulmonar, gastroenterológico e anestésico. A pessoa pode retornar ao hospital até o quinto ano, e após isso, a cada dois anos.
“O paciente deve estar consciente da participação em todas as fases da programação”, alertou a enfermeira responsável pelo programa e coordenadora do centro cirúrgico do HB, Gisele de Almeida.
Além do excesso de pele no braço e na coxa, fatores que limitam a movimentação da pessoa, o SUS contempla cirurgias plásticas reparadoras pós-bariátrica: 1) mamoplastia, devido à incapacidade funcional pela ptose mamária, com desequilíbrio da coluna; infecções cutâneas de repetição por excesso de pele; alterações psicopatológicas devido à redução de peso [critério psiquiátrico]; 2) abdominoplastia/torsoplastia, devido à incapacidade funcional pelo abdômen em avental e desequilíbrio da coluna; infecções fúngicas e bacterianas.
GASTROPLASTIA E VIDEOLAPAROSCOPIA
O projeto montado para 48 pacientes previa inicialmente apenas uma cirurgia por semana, por videolaparoscopia. Em 2015 o hospital inteirou 26 cirurgias e da primeira leva faltam agora 22.
Em vias de habilitação no Ministério da Saúde, o HB dispõe atualmente de aparelhos gastroplastia, balança, cadeiras, longarinas, balão, macas, esfigmo adaptado, videolaparoscopia, entre outros, para atendimento a pacientes de Rondônia, Amazonas, Acre e Mato Grosso.
“Antes, o encaminhamento ocorria sem registros, sem indicação, sem tratamento e sem triagem”, revelou a psicóloga Joelma Sampaio do Nascimento.
“A cirurgia é limitada para pacientes sem suporte familiar adequado, ou que tenham transtorno psiquiátrico não controlado, incluindo o uso de álcool ou drogas ilícitas. Se forem controlados, quadros psiquiátricos graves não são contraindicações obrigatórias”.
Ainda conforme Joelma, não podem se submeter a cirurgias pessoas portadoras de doença cardiopulmonar grave e descompensada que influenciem a relação risco-benefício; hipertensão portal, com varizes esofagogástricas; doenças imunológicas ou inflamatórias do trato digestivo superior que causem sangramento ou outras condições de risco; e síndrome de Cushing decorrente de hiperplasia na suprarrenal não tratada e tumores endócrinos.
JOVENS
Antes da recente resolução do Conselho Federal de Medicina, jovens entre 16 e 18 anos podiam fazer a cirurgia caso o risco-benefício fosse bem analisado. Além dessa análise e outras regras anteriores devem ser observadas novas exigências, entre as quais, a presença de um pediatra na equipe, crescimento dos punhos e a consolidação das cartilagens das epífises [parte de um osso longo que se desenvolve por um centro de ossificação diferente do corpo do osso].
O tratamento cirúrgico nos jovens entre 16 e 18 anos deve respeitar os índices de massa corpórea naqueles que apresentarem IMC³50 Kg/m² e IMC³ 40Kg/m², com ou sem comorbidade [associação de pelo menos duas patologias num mesmo paciente] e insucesso no tratamento clínico longitudinal feito na atenção básica e/ou atenção ambulatorial especializada, por no mínimo dois anos.
COMPREENSÃO E COMPROMISSO
O HB é o responsável pelas cirurgias e a Policlínica Oswaldo Cruz (POC) coordena o Programa de Obesidade, pelo qual a pessoa passa nove meses em tratamento intensivo com a equipe multiprofissional.
A avaliação clínica do jovem necessita constar em prontuário e deve incluir a análise de idade óssea e avaliação criteriosa do risco-benefício, explica a diretora Joelma do Nascimento.
Segundo ela, nos adultos com idade acima de 65 anos, a equipe multiprofissional faz avaliação individual, considerando a avaliação do risco-benefício, risco cirúrgico, presença de comorbidade, expectativa de vida e benefícios do emagrecimento.
O fluxograma dos pacientes nessa área inclui dois anos de tratamento clínico na POC. Na sequência, a pessoa é cadastrada no HB e inscrita no programa, após o que aguarda chamado para iniciar o preparo pré-operatório-enfermagem.
Examinam-se a situação psicológica, condições de nutrição e aspectos cardiológicos da pessoa. O próximo passo é a frequência à reunião de grupo visando à mudança de hábitos. Depois, a pessoa estará pronta para o termo de entendimento.
“Mas o paciente e seus responsáveis devem compreender todos os aspectos do tratamento e assumirem o compromisso com o segmento pós-operatório, cujo tempo é determinado pela equipe”, alertou a enfermeira Gisele de Almeida.
O acompanhamento de paciente pré-cirurgia bariátrica por equipe multiprofissional estabelece idade mínima de 16 e máxima de 110 anos, mediante informações do cartão nacional do SUS.
Fonte: rondonia.ro.gov.br