Desaposentação é o ato pelo qual o aposentado abre mão da sua aposentadoria. Mas por qual motivo, uma pessoa que já está aposentada iria querer se desaposentar, ou seja, abrir mão daquela aposentadoria?
Pergunta bastante intrigante, mas de fácil resposta.
A expectativa de vida do brasileiro tem melhorado a cada ano. Segundo os últimos dados divulgados pelo IBGE, o brasileiro possui expectativa de vida média de 75,2 anos (mulher: 78,8 anos e homem: 71,6 anos).
No Brasil as aposentadorias mais comuns no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o regime dos que trabalham com carteira assinada, são: aposentadoria por idade e aposentadoria por tempo de contribuição. Ambas são concedidas por ato de vontade do contribuinte. Ele solicita, o INSS analisa se os requisitos para concessão foram completados, logo após, o benefício é concedido.
Para aposentar-se por idade, o contribuinte deve ter 65 anos, se homem, ou 60, se mulher. No caso de trabalhadores rurais essa idade é diminuída em 05 anos. Além da idade, para fazer jus à aposentadoria é necessária a comprovação de, no mínimo, 180 contribuições, o que equivale a 15 anos de contribuição. Quanto maior o tempo de contribuição, maior a possibilidade de melhoria no valor do benefício.
Já na aposentadoria por tempo de contribuição, não há idade mínima para aposentar-se, basta que se comprove 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher. Esse tempo de contribuição pode ser diminuído em alguns casos especiais como o dos professores. Neste caso, quanto maior a idade e o tempo de contribuição, maior será a possibilidade de melhoria no valor do benefício.
– Explicando o que é desaposentação
Para melhor compreensão vamos a um exemplo: Determinada mulher começa a trabalhar com carteira assinada aos 16 anos de idade. Quando ela alcançar 46 anos, havendo contribuído com a Previdência em todo o período, ela terá 30 anos de contribuição e, portanto, já preencherá os requisitos para aposentar-se por tempo de contribuição.
Pensemos: uma mulher aos 46 anos, via de regra, está em plena vitalidade mental e física e pode perfeitamente continuar a trabalhar.
Essa mulher que aposenta-se aos 46 anos por tempo de contribuição não terá uma aposentadoria tão boa, porque o INSS aplica uma fórmula denominada fator previdenciário, que acaba, na maioria dos casos, por diminuir a o valor do benefício quando a pessoa é muito jovem.
Então essa mulher aos 46 anos de idade, já aposentada, continua trabalhando normalmente com carteira assinada para complementar a sua renda. Lembrando que ela continuará a contribuir para a previdência social sobre os rendimentos do seu trabalho.
Ao completar 61 anos de idade, sem ter parado de contribuir, ela já preencheria, em tese, os requisitos para outra aposentadoria, a por idade. Lembra-se? 15 anos de contribuição + 60 anos de idade.
Contudo, a legislação veda duas aposentadorias no regime geral. Mas o que me diz da possibilidade dessa mulher, abrir mão da sua primeira aposentadoria (desaposentação) para buscar um benefício novo agora aos 61 anos. Certamente a sua aposentadoria poderia melhorar o valor, já que agora ela está com mais idade e mais tempo de contribuição.
Isto é desaposentação, abrir mão de um primeiro benefício para a concessão de um novo benefício em melhores condições.
– A legislação infraconstitucional e a desaposentação.
Não há no ordenamento pátrio legislação que autorize a chamada desaposentação. Na verdade, na linha contrária existe dispositivo no decreto 3048/99 (Regulamento da Previdência Social) que determina que as aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela previdência social são irreversíveis e irrenunciáveis (art. 181-B). Assim, restaria inviabilizada a desaposentação, vez que é impossível a renúncia ao benefício.
Contudo, os defensores da desaposentação argumentaram que decreto não pode inovar no ordenamento, e se a lei ordinária não proibiu a renúncia, o decreto não poderia fazê-lo. Lado outro, a desaposentação não seria uma simples renúncia ao benefício, seria uma renúncia para concessão de outro, logo, a pessoa não ficaria descoberta.
Recentemente, em 2015, em meio a grande turbulência política, houve uma tentativa para regulamentação da desaposentação. O senado fez a proposta no bojo do projeto que culminou com a sanção da Lei 13183/2015. Entretanto, a presidenta Dilma vetou o art. 6º do referido projeto, que tratava exatamente dos contornos da desaposentação.
Como o veto não foi derrubado pelo Congresso Nacional, a desaposentação continuou sem um referencial legislativo para sua concessão.
– O entendimento dos tribunais
Posições em várias linhas foram verificadas pelos tribunais em todo o país. Alguns pela concessão outros pela impossibilidade. Mas outra discussão surgiu nesse caminho.
Havendo a possibilidade da desaposentação, o aposentado seria obrigado a devolver os valores já recebidos referentes ao primeiro benefício?
No ano de 2013, em Recurso Especial julgado no regime dos Recursos Repetitivos, o STJ firmou entendimento no sentido de ser desnecessária a devolução dos proventos recebidos; Firmou-se naquela oportunidade o entendimento de que os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, não sendo necessária a devolução dos valores recebidos.
Na origem, o Tribunal havia concedido a desaposentação, mas a condicionou à devolução dos valores recebidos.
– A decisão do STF
A discussão da desaposentação chegou ao STF e, a partir do reconhecimento da repercussão geral do tema, paralisou milhares de processos em todo o país, para que a Suprema Corte emanasse a sua decisão definitiva sobre o caso.
No julgamento, entre tantas ponderações contrárias e favoráveis, prevaleceu a tese da IMPOSSIBILIDADE da desaposentação, tendo em vista que não existe lei que a regulamente.
A tese fixada foi a seguinte: “No âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à ‘desaposentação’, sendo constitucional a regra do artigo 18, parágrafo 2º, da Lei 8.213/1991”.
A tese fixada servirá de parâmetro para mais de 68 mil processos sobre o tema que estão sobrestados (suspensos) nos demais tribunais.
Agora todos esses processos receberão os efeitos da decisão do STF pela impossibilidade da Desaposentação.
– O aposentado que continua trabalhando e contribuindo para a Previdência
Lembra-se da moça do início deste artigo que aposentou-se por tempo de contribuição aos 46 anos e continuou trabalhando?
Pois bem, o que acontece com essas contribuições que ela fez durante os outros 15 anos da vida dela? Afinal, no nosso exemplo, ela já está com 61 anos de idade e continua contribuindo para a previdência sobre seu rendimento laboral.
Neste caso é necessário compreender a sistemática adotada pela previdência pública no Brasil, que adota o chamado sistema de repartição simples. O que isso significa?
A contribuição realizada à previdência por determinada pessoa não serve para formar um fundo individual para sua aposentadoria, pelo contrário, esse valor compõe um fundo único que faz frente a todos os benefícios concedidos pelo Sistema. É, em verdade, um pacto de solidariedade, onde uma geração contribui para a outra.
Não há aqui ilegalidade ou inconstitucionalidade referente aos valores de contribuição por quem já está aposentado (esta tese já foi enfrentada pelo STF), por conta desse princípio da solidariedade.
Quem já está aposentado e continua trabalhando e, portanto, contribuindo para a previdência tem direito apenas à ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. Essa é determinação do art. 18, §2º da Lei 8213/91, que teve a sua constitucionalidade reafirmada pelo STF.
Acesse nosso blog: DireitonaRede