(ANSA) – No fim de outubro, manifestantes pró e contra o republicano Donald Trump entraram em confronto na Avenida Paulista, em São Paulo, e mostraram que o clima bélico instaurado na eleição presidencial nos Estados Unidos atravessou o continente. Mas haveria diferença para o Brasil se o magnata ou sua rival, a democrata Hillary Clinton, vencessem a votação desta terça-feira?
Para o professor Geraldo Zahran, coordenador do Observatório Político dos Estados Unidos (Opeu), não. Segundo ele, existem mecanismos das relações bilaterais que caminham independentemente de quem for o inquilino da Casa Branca ou até mesmo do Palácio do Planalto.
“Na forma de lidar com o país, pouca coisa seria diferente. Os dois conhecem o Brasil. Hillary já esteve aqui com Bill Clinton, como secretária de Estado, recebeu Dilma, tem contatos aqui, é entusiasta da relação com o Brasil e de mecanismos multilaterais de maneira geral. Trump também conhece o país, tem investimentos no Rio”, explica Zahran.
Além disso, o país deve continuar tendo uma importância apenas marginal para a política externa norte-americana. “Somos um tema que aparece com alguma questão hemisférica ou multilateral, mas não somos prioridade – e nem precisamos ser”, acrescenta o coordenador do Opeu.
Contudo, se o Brasil não será afetado diretamente pelo resultado da eleição nos EUA, o país pode sofrer os impactos indiretos de um aumento da tensão na geopolítica mundial caso Trump seja eleito. “Se ele vencer, acho que o terceiro mundo todo sofrerá os impactos porque Trump coloca interesses norte-americanos, os piores interesses norte-americanos, acima dos demais interesses da humanidade”, diz Rogério Baptistini, professor de sociologia da Universidade Mackenzie.
Zahran tem opinião semelhante, mas com explicações diferentes. Em sua visão, uma vitória do magnata pode servir de combustível para propagar um discurso populista, xenófobo e racista no Brasil e no resto do mundo. “Outro argumento é que se Trump colocasse em prática uma política de reduzir a presença na Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte], isso significaria um ambiente internacional muito menos estável e talvez afetasse o Brasil”, salienta.
Ambos apontam a democrata como uma entusiasta de órgãos multilaterais e da busca por consenso sobre os problemas comuns do mundo, até por ser alguém com sólida formação acadêmica e trajetória na política – embora isso não tenha impedido críticas a seu trabalho como secretária de Estado (2009-2013), principalmente na gestão da crise na Líbia.
“Trump inviabilizaria isso, sobretudo nos graves problemas ligados ao extremismo religioso. Um sujeito como ele trabalha em uma lógica de eliminação do inimigo. A política para ele é guerra. E uma pessoa como Hillary, já experimentada no mundo da política, certamente caminharia no sentido de facilitar a construção de pontes”, acrescenta Baptistini.
Imigração
Uma eventual vitória do candidato republicano também poderia ser determinante para o futuro de imigrantes brasileiros nos Estados Unidos, principalmente os ilegais. Um dos pilares da campanha do bilionário é um discurso radicalmente contrário à imigração, que inclui as promessas de construir um muro na fronteira com o México e barrar a entrada de muçulmanos no país.
Além disso, ele já declarou que a criação de uma força-tarefa para expulsar estrangeiros clandestinos seria uma de suas primeiras medidas na Casa Branca. O Migration Policy Institute (MPI), think tank especializado no tema e baseado em Washington, estima que há entre 67 mil e 112 mil brasileiros vivendo de maneira irregular em solo norte-americano.
“Caso Trump vença, essa plataforma agressiva contra a imigração que ele tem adotado pode gerar algum problema para as comunidades brasileiras nos EUA”, conclui Zahran. (ANSA)