Diretora da Casa da Mulher Brasileira, Susan Lucena. Foto: (Handson Chagas)
A cultura do “beijo roubado” no carnaval, além de assédio sexual, pode ser tipificada como estupro desde 2009, por meio da Lei n° 12.015. Quem alerta é a diretora da Casa da Mulher Brasileira no Maranhão e também advogada, Susan Lucena.
De acordo com Susan Lucena, a legislação permite que qualquer toque não consentido com conotação fortemente sexual configure violência análoga ao estupro, não necessitando mais da conjunção carnal para comprovação do crime.
Foi a partir desse entendimento que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou a decisão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMT) que havia absolvido um jovem de 18 anos por forçar um beijo em uma adolescente de 15 anos.
A adolescente caminhava na rua quando foi jogada no chão pelo agressor, que usou um dos joelhos para pressionar seu abdômen e mantê-la rendida para obter o beijo forçado. A vítima também teve sua blusa rasgada durante a agressão.
Consta nos autos que a conjunção carnal poderia ter acontecido se o agressor não tivesse sido surpreendido por um homem, que se aproximou em uma motocicleta. Para o STF, a situação apresenta todos os elementos que configuram estupro.
O caso abre jurisprudência para condenações semelhantes. Durante o carnaval, o folião ou foliã deve ficar atento e denunciar violências como essa para o policial mais próximo.
“A primeira coisa que a vítima deve buscar é garantir a própria segurança, se afastando do agressor”, orienta Susan Lucena. “Depois, fazer a denúncia ao policial para que este possa coletar provas, como depoimentos de testemunhas”, explica, acrescentando que se o policial presenciar a agressão, deve prender o suspeito em flagrante.
Em parceria com a Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP), órgãos de proteção à mulher estão treinando policiais para identificar e reprimir casos de violência sexual no Carnaval , promovido pelo Governo do Maranhão. A Secretaria de Estado da Mulher (SEMU) também prepara material educativo para distribuição no circuito oficial.
“A punição também é educativa para que outros não repitam a violência”, defende Lucena. O aspecto pedagógico da repressão ajuda a combater a cultura do estupro, que naturaliza a violência sexual.
Cultura do estupro
Segundo pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2016, 65% da população brasileira tem medo de ser vítima de agressão sexual. Entre mulheres, este dado chega a 85%. Na Região Nordeste, o índice salta para 90%.
Os dados são reflexo do machismo, que não só estimula a violência de gênero como ajuda a propagar a falsa ideia de que a culpa pela agressão é da vítima. De acordo com a pesquisa, 37% da população acredita que “mulheres que se dão ao respeito não são estupradas”.
A mesma pesquisa aponta que 91% dos brasileiros acreditam que temos que ensinar meninos a não estuprar. A opinião quase unânime aponta o reconhecimento de uma cultura a ser combatida para interrupção das agressões.
“Principalmente nos casos de estupro, a mulher tenta achar o que poderia ter feito para evitar a violência. Isso se reflete em um baixo índice de denúncias de estupro”, analisa Susan Lucena.
Para ela, a informação é uma arma para que a vítima se sinta autorizada a denunciar, e, assim, ajudar a romper com o ciclo da violência. “A gente começou a tomar um espaço na mídia de destaque, para a defesa de direitos, de igualdade”, diz Lucena, sobre a importância de debater o assunto para a prevenção de novos casos.
O QUE DIZ A LEI
Estupro
Lei n° 12.015 de 2009
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Assédio sexual
Decreto-Lei Nº 3.688, de 1941 (Lei das Contravenções Penais)
Art. 61. Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor: Pena – multa.
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