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O Rio Grande do Norte é o estado brasileiro com o maior número de vítimas de estupro do País. E não estamos falando de proporcionalidade e sim de números absolutos. Dos quase 23 mil registros feitos de vítimas de estupro no Sistema Único de Saúde (SUS), mais de 4 mil ocorreram no território potiguar. Para se ter uma ideia do quão a frente o estado está, o segundo colocado é Pernambuco, com quase a metade desses registros (2.100).
A informação é do Atlas da Violência e foi divulgada nesta semana, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). E, tão grave quanto saber dessa situação, é pensar que nada está sendo feito para conter essa onda de violência. Pelo menos, não na visão da promotora de Justiça, Erica Canuto, da Promotoria de Defesa da Mulher. “A gente está preocupado, somente, com os traficantes, as facções. Não que não devesse estar, mas não somente, porque com isso, esses crimes alarmantes, que têm modificado a vida de muitas pessoas, não estamos nos preocupando”, afirma Canuto, na entrevista que foi concedida ao Jornal das Seis, da 96fm.
Segundo a promotora, atualmente, não existe um plano de ação ou políticas específicas no combate ao crime e na atenção as vítimas do estupro. “Deveríamos estar nos preocupando desde o início, na escola, diminuindo as diferenças, por exemplo”, afirmou a promotora, acrescentando que, como não se tem esse cuidado, a “cultura do estupro” permanece forte em todo o Brasil. “Tem uma coisa muito errada nesse País, porque você julgar uma mulher pela roupa que ela usa, pela forma como ela se comporta, se ela bebe, fuma. Se diz um palavrão”, critica.
Erica Canuto ressalta que esses números do Atlas da Violência demonstram o fortalecimento da cultura desse crime, uma vez que das 4.088 mulheres que foram atendidas na rede pública de saúde após serem vítimas de estupro, apenas 206 delas levaram o caso adiante e chegaram a denunciar nas delegacias. “E quem iria querer dizer no hospital que foi vítima de estupro se não tiver sido realmente? Quem iria querer ser ‘a pessoa que foi estuprada?’”, questiona a promotora, antes que se levante dúvidas sobre os números informados.
Por isso, além desse dado, a promotora ressalta outros, como, por exemplo, o fato de 60% das vítimas terem como estupradores pessoas conhecidas por elas. Amigos, namorados e até maridos entram nessa lista. “Os casos dos tarados no beco escuro são minorias hoje”, revela Erica Canuto, acrescentando que é cada vez maior a quantidade de mulheres vítimas do crime durante festas, após beberem ou serem drogadas. E isso acaba por elevar o questionamento sobre a “culpa da vítima” nas ocorrências.
“A dúvida é justamente essa cultura machista que não permite que a mulher possa contar versão dela sem que seja questionada. ‘Ah, você foi para aquela festa, será que não deu bola para ele? Será que ele não entendeu que você estava se insinuando?’ Então, o questionamento sobre a palavra da mulher na questão do estupro ele é social. É na justiça, é na polícia. É em todo lugar. É a palavra dele contra a dela”, lamenta.