Nascido no interior de São Paulo, o ator Emmilio Moreira, estreou pela primeira vez no teatro quando tinha 18 anos, quando começou a produzir espetáculos no eixo Rio-São Paulo. Se formou em licenciatura em geografia pela Universidade Estadual de Campinas, e começou a ministrar aulas para se manter financeiramente.
No cinema, o ator já participou de produções como “Chorar de Rir”, “Filme B – O Vampiro da Paulista”, entre outros sucessos. Entre seus grandes espetáculos estão a adptação de “Tio Vânia”, intitulado de “Tio Ivan”, dirigido por Anton Tchekhov, “Doze Homens e Uma Sentença”, “Ofélia em OFF” e a “História do Menino Minguado filho da Lua Cheia”, dirigido por Fernanda Coelho.
Atualmente está interpretando o personagem Vicente Almeida na novela “Orgulho & Paixão” da Rede Globo, que leva direção de Fred Mayrink.
Quando foi que o teatro passou a fazer parte da sua vida?
Era bem menino ainda, devia ter uns 10 anos, e eu gostava de ser um dos comentaristas da missa na Paróquia Santo Antônio, em Jales, interior do Estado de São Paulo. Um dia eu percebi que o que eu gostava mesmo era do palco, era daquelas pessoas todas me olhando enquanto eu lia no púlpito a liturgia da missa. Quando, aos 14 anos, meus pais se mudaram para Bauru, a primeira coisa que fiz foi procurar um curso de teatro. E, desde então, o teatro sempre esteve no centro de interesse da minha vida.
Antes mesmo de se formar em artes cênicas pela Universidade Estadual de Campinas, você chegou a cursar Geografia durante um tempo. O que o motivou a ir por esse caminho?
Eu me graduei em Geografia. Como bom libriano, tinha medo de passar dificuldade quando chegasse a hora de cursar Artes Cênicas na Unicamp. Então, montei uma estratégia para poder trabalhar – dos 17 aos 21 anos, ainda morando com meus pais em Bauru, cursei Geografia. Assim que terminei essa faculdade, prestei Artes Cênicas e passei. Daí, dei aula de Geografia num colégio em frente ao campus durante esse período, e por mais um ano, depois formado, quando me mudei para São Paulo. Aos poucos a vida foi entrando em outro ritmo, não dei mais aulas. Mas durante o curso, foi a forma que encontrei para me sustentar e me manter independente vivendo em Campinas.
No início da sua profissão, como foi o apoio da família?
Ser ator no Brasil é sempre complicado, ainda mais para um jovem do Interior, sem ninguém da família ligado às Artes. Sequer conhecia São Paulo ou Rio de Janeiro. Parecia um sonho muito distante e meus pais viam meu sonho com alguma preocupação e reserva. Esse descontentamento deles, neste momento inicial, me fortaleceu, acabou me dando força para ir a diante. Tinha que dar certo, pois só dependia de mim!
Como foi seu primeiro contato profissional com a arte?
Sempre fui muito apaixonado e entusiasmado com a arte da representação. Na infância não tive contato diretamente com o teatro. Via televisão, ia ao cinema e, só de assistir, tudo aquilo já me inspirava a ‘querer ser como eles’, a viver outras realidades diferentes da minha. Em essência, sinto que amo os atores e atrizes, e sua dedicação quase ‘heroica’ à profissão. Então, quando fui tomando mais contato com esses profissionais, sentia muita gratidão por viver cada projeto. Mas sempre estive e estou atento para não perder o entusiasmo e a alegria de viver cada conquista. E fui conquistando meu espaço ‘comendo pelas beiradas’, como se diz, minhas primeiras experiências, por exemplo, foram em espaços alternativos.
Fale um pouco sobre sua experiência interpretando Vicente Almeida em “Orgulho e Paixão”?
Vicente é um sujeito fiel a Darcy Williamson (personagem de Thiago Lacerda), é especialista em construção de ferrovias, tecnologia trazida pelos ingleses para o Brasil. Tem um lado sério, responsável, muito profissional e um tanto ingênuo, mas na sua vida amorosa é engraçado e ousado. Suas cantadas me divertem. Esse lado mais cômico me possibilita dar outra camada ao personagem, e mostrar outro lado meu como ator. A experiência tem sido transformadora para mim, pois tenho a oportunidade de trabalhar com atores incríveis e que admiro muito. Só para citar alguns: Thiago Lacerda, Vera Holtz, Nathalia Dill, Nathalia do Valle, entre tantos colegas talentosos. Sabe aquela sensação de estar no lugar certo e na hora certa? Neste momento da minha vida, não quero outra coisa do que estar fazendo Orgulho e Paixão e estar na TV Globo. A produção é esmeradíssima e me inspira a quer fazer mais televisão.
Atualmente, você está participando de duas séries simultaneamente, em “Gamebros” e “Velhas Amigas”, ambas da Netflix. Como está sendo se dividir entre as duas?
Gravei a primeira temporada dessas séries em 2017, antes de começar a novela. Gamebros é uma série policial. O roteiro é muito inteligente e a série tem ‘ganchos’ que só se resolvem no final. Faço o Glauber, um investigador marrento e teimoso, e que é também um contraponto cômico ao protagonista. Foi uma surpresa pra mim me ver neste lugar da comédia. Já em Velhas Amigas, meu personagem morre logo no primeiro episódio, mas depois volta ‘póstumo’, no episódio 5, para um acerto final – uma ‘DR’ com sua esposa. Foi um presente poder viver essa personagem, pois o texto é muito poético. Tudo dando certo vamos gravar a segunda temporada dessas duas séries agora em 2019.
Como foi participar do elenco de “Meu Primeiro Vestido” em 2017?
“Meu Primeiro Vestido” é um curta-metragem do Ap43 – um inovador e pioneiro grupo de pesquisa em Cinema. Faço parte deste grupo desde quase sua criação, há 6 anos. A proposta é bastante criativa e conduzida de forma brilhante por Nara Sakarê, que soma uma bagagem como atriz, preparadora de elenco e diretora, tem um olhar agudo e uma mão precisa para desenvolver os atores. Nesse curta, meu personagem é um homem casado que vive vidas paralelas: uma, a convencional com sua mulher, num casamento estável e tranquilo; e outra como namorado de um homem que é o oposto dele, livre de amarras e libertário. Ele realmente acredita que é possível separar estes dois mundos. Questões importantes são discutidas: bissexualidade, casamento, machismo, o que é mesmo uma traição, os modelos sociais impostos, escolhas e perdas… O filme já está em fase de finalização, para ser lançado. O processo de criação é o cerne da nossa pesquisa no Ap43. O roteiro nasceu das personagens. Passamos meses experimentando essas personagens, suas histórias, suas questões, seus dilemas. Os atores não ‘correram’ atrás de realizar um roteiro pronto, como acontece no cinema tradicional. A proposta do Ap43 é que o roteiro se desenvolva da potência dos personagens criados por cada ator como base de uma história a ser contada pelo grupo. Nós invertemos a lógica do fazer cinematográfico para ficar na autonomia de criação do ator no cinema.
Na sua última peça, “Tio Ivan”, uma adaptação da história de “Tio Vânia”, quais os desafios enfrentados para esta encenação?
A diretora propôs uma adaptação do Tio Vânia de Anton Tchekhov (autor russo) trazendo a história para o Brasil do começo do século XX. Coincidentemente, a peça se passava na mesma época em que se passa a novela Orgulho e Paixão. Sou apaixonado por Tchekhov, e como consegue – com suas personagens em suas vidas banais, cotidianas – discutir o sentido da vida, expor o mergulho que fazem no seu vazio existencial. A experiência foi boa e, de algum modo, me preparou para viver o Vicente na novela. O bigode, por exemplo, eu tinha deixado crescer para a peça. Antes tinha feito outra peça sobre o tema, A Máquina Tchekhov, de Matéi Visniec. A dificuldade maior é dar conta do mergulho que Tchekhov propõe, seus personagens são arquetípicos, universais. Desejo sempre poder voltar ao seu universo criativo. Tchekhov é um dos grandes amores da minha vida como artista!
Qual a maior dificuldade que você considera na profissão de ator?
A precariedade e abnegação necessárias para se poder viver da arte! Estamos em um País em que a Cultura não faz parte do projeto político, assim como a Educação. Aqui, Educação e Arte não são valorizadas, e a violência e a ignorância viram ‘o espetáculo’! Abnegação, porque a paixão pela profissão exige nos entregarmos ao oficio sem a certeza de nada – é um ‘salto no escuro’. Já fiz muito projeto de graça, ou com remuneração inadequada, pois acreditava no projeto. Mas a parte concreta do dia a dia não espera: temos as contas, os compromissos, nossa dignidade, os investimentos em estudo, saúde, etc… Em uma música do Chico Buarque, ele menciona o ditado: “Festa acabada, músicos a pé”. Quando termino um projeto bate aquele medo de não ter mais… Há sempre um sofrimento até o próximo projeto, próximo sonho. E o ciclo recomeça. Essa sem dúvida é a parte mais difícil da profissão – manter a esperança, insistir, perseverar, querer mais.
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