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Por Odir Cunha, do Centro de Memória
26 de agosto de 1973. Domingo de garoa fria, Morumbi superlotado. Campeão do primeiro turno, o Santos decide o Campeonato Paulista de 1973 com a Portuguesa de Desportos, campeã do segundo. Após o empate em zero a zero no tempo normal, os times jogam uma prorrogação de 15 por 15 minutos que também termina sem gols. Então, na disputa por tiros diretos da marca do pênalti, o árbitro Armando Marques comete o maior erro de sua inconstante carreira e provoca a divisão de um título que naquele momento era 96,85% santista. Vamos aos fatos…
Depois de um primeiro turno irretocável, que venceu invicto, com oito vitórias e três empates, e no qual brilhou a dupla formada pelo já veterano Pelé, de 32 anos, e o garoto Euzébio, de 21, o Santos deu prioridade às excursões internacionais e abriu mão de lutar pelo título do segundo turno, conquistado pela Portuguesa.
O Morumbi já tinha recebido 103.887 pessoas na final do Campeonato Paulista de 1971, entre São Paulo e Palmeiras, mas em 1973, impulsionada pela imensa torcida santista, que ocupou 80% do estádio, a final entre Santos e Portuguesa bateu os recordes de renda e público do Estado, com 1,5 milhão de cruzeiros e 116.156 pagantes.
Escalado por Pepe, o Santos jogou com Cejas, Zé Carlos, Carlos Alberto, Vicente e Turcão; Clodoaldo e Léo Oliveira; Jair da Costa (depois Brecha), Eusébio, Pelé e Edu. A Portuguesa, dirigida pelo experiente Otto Glória, foi a campo com Zecão, Cardoso, Pescuma, Calegari e Isidoro; Badeco e Basílio; Xaxá, Enéas (depois Tatá), Cabinho e Wilsinho.
No campo, o Santos sempre foi mais ofensivo. Com uma equipe mais experiente e qualificada, o time dominou os dois tempos, criou boas oportunidades, acertou duas bolas na trave (Edu e Pelé, em cobranças de faltas), mas não marcou. Na prorrogação, a Portuguesa correu mais, equilibrou a partida, mas a falta de gols persistiu.
O lateral-direito Zé Carlos cobrou o primeiro pênalti à meia altura, rente à trave direita, mas Zecão saltou e fez grande defesa. Em seguida, Isidoro bateu e Cejas saltou para tirar a bola do ângulo.
Carlos Alberto fez o primeiro gol da tarde ao colocar no canto direito, enquanto Zecão caía para o esquerdo. Calegari bateu fraco no canto direito e Cejas saltou para fazer mais uma defesa.
Edu deu uma bomba no canto direito e mais uma vez Zecão escolheu o outro canto. Na terceira cobrança da Portuguesa Wilsinho acertou o travessão e Cejas começou a comemorar, num gesto que contagiou o time, o estádio e até quem não devia, pois Armando Marques imaginou que a decisão estava decidida e deu o jogo por encerrado, com o título para o Santos.
Na verdade, como o Santos vencia por 2 a 0, mas faltavam duas cobranças para cada lado, ainda havia uma pequena possibilidade de a Portuguesa chegar ao empate. Para isso, Pelé e Léo Oliveira teriam de perder suas cobranças e Basílio e Tatá precisariam converter as suas.
Ninguém no Morumbi se deu conta do erro de direito cometido pelo árbitro. Os jogadores comemoraram no campo, a torcida saiu cantando do estádio, mas no vestiário da Portuguesa alguém alertou para a falha e antes que os jogadores fossem obrigados a voltar a campo para as cobranças restantes, foram puxados rapidamente para o ônibus, ainda sem tirar os uniformes. Só foram tomar banho no Canindé.
Sem a possibilidade de decidir o título naquele dia, o jeito seria marcar uma nova partida. Mas três dias depois já começaria o Campeonato Brasileiro e não haveria datas para um novo tira-teima. Assim, de uma maneira melancólica e um tanto malcheirosa, até porque o arranjo foi feito ao lado dos banheiros do Morumbi, decidiu-se que Santos e Portuguesa seriam declarados campeões paulistas de 1973.
Injustiça comprovada pela matemática
Por todos os números o Santos merecia ter sido o campeão absoluto de 1973. Na soma dos dois turnos ganhou 32 pontos, contra 29 da Portuguesa; obteve 12 vitórias, contra nove; marcou 31 gols, contra 26; sofreu 11 gols, contra 15; teve um saldo de 20 gols, contra 11. E Pelé se sagrou artilheiro do Campeonato Paulista pela décima primeira vez, com 26 gols.
Mas as revelações matemáticas mais impressionantes se referem à possibilidade de vitória na decisão interrompida das cobranças de pênaltis. O cálculo chega a ser simples. Se para cada cobrança só há duas possibilidades, a de marcar o gol ou não marcá-lo, a situação se assemelha ao sorteio de cara e coroa. Vejamos.
Se faltavam quatro pênaltis, dois para cada equipe, e só haveria empate se houvesse uma sequência exata de duas conversões para a Portuguesa e dois erros para o Santos, a possibilidade matemática de que isso ocorresse é a soma de quatro situações ½ + ½ + ½ + ½, o que dá 1/16, ou 6,25%.
Porém, após o empate a disputa ainda prosseguiria e a chance de vitória seria de 50% para cada time, ou mais ½, o que resultaria na porcentagem final de 96,85% de possibilidades de vitória para o Santos e, consequentemente, de 3,15% para a Portuguesa.
Isso sem contar a probabilidade de acerto de cada jogador, pois Pelé tinha um nível de aproveitamento superior a 80% e Léo era o cobrador oficial de pênaltis do Santos. Seria tremendamente improvável que os dois desperdiçassem suas cobranças.
Bem, de qualquer forma o Santos foi campeão paulista de 1973, assim como a Portuguesa – repetindo, ironicamente, o que ocorreu em 1935, quando cada time conquistou o título estadual por uma liga diferente.
Fonte: www.santosfc.com.br/o-dia-em-que-o-santos-foi-9685-campeao
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