Odir Cunha, do Centro de Memória
Ele corria 25 metros em três segundos, de repente brecava e mudava a direção, deixando o marcador no vácuo. Seus cruzamentos eram calculados e seus chutes potentes. Também cabeceava com eficiência, apesar de ter apenas 1,69m. João Paulo de Lima Filho, o “Papinha da Vila” (apelido dado em referência ao Papa João Paulo II), nascido em 15 de junho de 1957, em São João do Meriti/RJ, um dos últimos pontas pontas do futebol brasileiro, está fazendo 63 anos.
De uma época em que os técnicos achavam melhor ter um especialista na extrema esquerda do que um lateral que eventualmente avançasse por ali, João Paulo dominava aquele corredor como só os grandes ponteiros conseguiram. Herdeiro de uma estirpe que começa com Arnaldo Silveira, passa por Evangelista, Tite, Pepe, Edu e Abel, João Paulo deixou seu nome na história dos maiores pontas-esquerdas do Alvinegro Praiano.
Chegou do São Cristóvão ainda com 19 anos e estreou no Santos em 5 de junho de 1977, no empate de 1 a 1 com o Botafogo, em Ribeirão Preto, pelo Campeonato Paulista. Naquele domingo, escalado por Otto Glória, o Alvinegro jogou com Willians, Zé Maria, Marçal, Alfredo Mostarda e Fernando; Zé Mario e Aílton Lira; Nílton Batata, Juary (Bianchi), Jorginho Maravilha (Calú) e João Paulo. Juary fez o gol santista.
Não se tornou titular imediatamente. Durante um tempo ficou na reserva de Bozó. Também Reinaldo ás vezes era escalado pela esquerda. Mas em outubro de 1977 Otto Glória já o promovera a titular, e nunca mais perderia a posição.
Aquele Santos com ele pela esquerda, Nilton Batata pela direita, Juary pelo meio e ainda com os meias Pita e Ailton Lira foi um dos times mais ofensivos do final dos anos 70.
Desacreditado, sem dinheiro para grandes contratações, nas mãos do técnico Chico Formiga o Santos se tornou a equipe dos “Meninos da Vila”, garotos endiabrados que faziam os adversários tremerem e davam à massa santista o prazer de momentos que tinham se tornado escassos.
No começo de 1978 pesquisa da revista Placar revelou que o Santos tinha a quarta torcida do Brasil, com 9,7% da preferência no País, apenas 0,4% atrás da torcida vascaína. A geração que se apaixonou pelo time devido a Pelé & Cia só queria um motivo para entupir aos estádios.
Em 1977 os santistas já tinham dado uma clara demonstração de força ao lotar o Morumbi nos dois jogos da Taça Governador do Estado, só perdida nos pênaltis para o campeão espanhol Atlético de Madrid. E em 11 de dezembro, em um jogo pelo Campeonato Brasileiro, contra o Palmeiras, tinham batido o recorde de público no Pacaembu, com um total de 73 523 pessoas.
Faltava a perspectiva de lutar por um título, e ela veio com o Campeonato Paulista de 1978. Insuflado pelo clamor das arquibancadas, do meio de campo para a frente aquele time era tão rápido que o seu jeito de jogar foi batizado de futebol-discoteca. Realmente, “You should be dance”, dos Bee Gees, parecia ser o fundo musical perfeito para o ritmo daqueles garotos.
Rápido de pernas e de raciocínio, João Paulo vestiu a camisa 11 do Peixe de 1977 a 1983, saiu para defender Flamengo, Corinthians, Palmeiras, Yamaha (Japão), São José, Grêmio Maringá, e, como um bom filho, retornou à Vila Belmiro em 1992, onde encerrou a carreira em 9 de maio de 1992, na derrota por 2 a 1 para o Cruzeiro, na Vila Belmiro.
No Santos, além do Campeonato Paulista de 1978, João Paulo foi campeão do Torneio Vencedores da América, no Uruguai, e do Torneio Cidade de Pamplona, na Itália, ambos em 1983. Fez 413 partidas pelo Peixe e é o terceiro maior artilheiro na era pós-Pelé, ao lado de Serginho Chulapa, com 104 gols. Enquanto esteve no Alvinegro Praiano jogou cinco partidas pela Seleção Brasileira e marcou um gol.
Ao se aposentar como jogador, trabalhou como supervisor das categorias de base do Santos. A exemplo de tantos outros ídolos, adotou a cidade de Santos para viver com a família.