Foto: Acervo do jornal “A Notícia” disponibilizado por Fernano Wanner e Anderson Adriano
O ano era 1980. O Corinthians vinha de títulos importantes em anos anteriores que tiraram o Alvinegro da fila de conquistas. Mesmo com saídas e chegadas de novos jogadores, iniciava a formação de um de seus principais elencos da história, que ganhou relevância dentro e fora de campo nos anos seguintes, em um período que ficaria marcado por títulos e, claro, pelo movimento Democracia Corinthiana.
O Argentinos Juniors, centenário clube argentino do bairro de La Paternal, era conhecido pela evolução no modo em que tratava as categorias de base. Naquela época, realizava um trabalho de desenvolvimento de uma promessa argentina, um jovem garoto de 20 anos chamado Diego Armando Maradona, que já despontava como um futuro craque de seu país.
Foto: Maradona em partida pelo Argentinos Juniors. Divulgação/Site Argentinos Juniors
O Alvinegro paulista, comandado por Oswaldo Brandão, não teve desempenho de encher os olhos no ano de 1980, mas era uma equipe aguerrida e chamava a atenção nacionalmente quando entrava em campo, liderado pelo camisa 8, Sócrates, que tinha sido convocado pela seleção brasileira em 1979 e também já se colocava como um dos nomes que poderia compor o meio de campo do Brasil na Copa do Mundo de 1982.
Foto: Divulgação Corinthians
Foi nesse contexto que, em 1980, Manoel Chaves, na época presidente do Nacional FC, de Manaus, resolveu organizar um amistoso internacional entre Corinthians x Argentinos Juniors, visando um embate entre os craques de Brasil e Argentina: Sócrates x Maradona. Naquele ano, a cidade já havia recebido grandes jogos com ótimos públicos, como Fast Club x New York Cosmos, com mais de 80 mil pessoas, e também o clássico carioca Flamengo x Vasco. A ideia dos organizadores era encerrar o ano “com chave de ouro” com o amistoso no mês de novembro.
Em entrevista realizada em 2020 pelo jornalista Rafael Valente para o site da ESPN, o dirigente contou um pouco mais sobre a escolha: “Eu conhecia um empresário que tinha amizade com os dirigentes dos clubes paulistas. O Corinthians era o clube de São Paulo que mais levava público aos estádios, dentro ou fora do Estado, atravessava uma fase magnífica, e seria como um Brasil x Argentina, um clássico sul-americano, para os torcedores de Manaus”, afirmou.
Tudo estava organizado e preparado para o estádio Vivaldo Lima, o Vivaldão, receber o confronto, e jornais da época celebravam a partida à medida que a data se aproximava. O jornal “A Notícia”, que circulava nas manhãs de Manaus, destacava: “O jogo do ano”.
Um dos jogadores do Alvinegro que entrou em campo naquela partida foi Basílio, personagem importantíssimo na história do Corinthians com o gol que havia tirado o jejum de títulos do Timão três anos antes, em 1977. E o ex-volante relembrou alguns momentos do pré-jogo:
“Nós saímos de São Paulo para Manaus e eu lembro que, quando chegamos lá, a cidade estava em festa, só falavam de Sócrates contra Maradona, todos na expectativa. Eu, como jogador, também estava na expectativa de enfrentar o Maradona naquele seu início de carreira. Aquilo foi sensacional para a gente”.
As delegações dos dois clubes chegaram em Manaus no dia anterior ao da partida. No entanto, uma surpresa que não estava nos planos dos organizadores do evento: Maradona não viajou com o elenco argentino.
A informação caiu como uma bomba e acabou frustrando parte do público, que havia esgotado os ingressos. Todos esperavam ver os dois astros em campo. As comparações entre o brasileiro e o argentino tornaram-se a principal pauta de discussão.
“Ele já era o Maradona, um jogador diferenciado. A expectativa sobre ele era muito boa e positiva, tanto que a divulgação era Sócrates x Maradona. A espera foi tão grande, mas a decepção foi maior ainda sobre esse duelo”, destacou Basílio.
Ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Oswaldo Brandão ressaltou que o Corinthians estava acima de qualquer duelo pessoal que poderia ou não acontecer no amistoso: “Não importa que seja o Argentinos Juniors ou outro time estrangeiro. O que importa é que o Corinthians jogue bem e ganhe. A presença do Maradona é importante apenas na medida em que se trata de um jogador que dá espetáculo, com belos dribles e chutes fortes e certeiros”.
A espera pelo craque argentino ficou ainda maior, muitas informações e teorias circulavam entre as pessoas, que ainda não tinham certeza que ele realmente não chegaria para o amistoso em Manaus. No entanto, no dia de jogo, a informação da ausência de Maradona foi confirmada, como relembra Basílio:
“De repente, quando nós chegamos no estádio, tomado por torcedores, todo mundo na expectativa, querendo saber se o Maradona chegou. Até que conversamos com um argentino, que disse: ‘Não, Maradona não vai vir’. Aí você imagina aquele estádio todinho lotado, a decepção foi grande”, recordou.
Foto: Imagens da partida publicadas pelo jornal “A Notícia” circulado em Manaus
A imprensa, então, foi buscar os motivos e descobriu que o craque argentino teve uma gravação de comerciais com um de seus patrocinadores, na Alemanha, e não chegaria a tempo de disputar o amistoso.
Além disso, Sócrates também revelou, em entrevista ao jornal “A Notícia”, que entraria para vencer a partida, independentemente de qualquer situação: “Vou me esforçar em campo pela vitória, que é nosso principal objetivo. Além do mais, a torcida amazonense quer ver um bom espetáculo e eu preciso me apresentar bem nesta minha estreia em Manaus”, disse o eterno camisa 8 do Coringão.
“O Magrão sempre foi um profissional diferenciado, em tudo quanto é aspecto. Como jogador então, dispensa qualquer comentário. Ele tinha uma inteligência muito boa, até no aspecto de comandar o grupo. O Sócrates sempre agiu de uma maneira boa e positiva, sempre buscou ajudar os diversos profissionais que estiveram com ele”, afirmou Basílio, recordando a sua importância para o grupo naquela época.
Mesmo sem o astro do lado de lá, tudo estava pronto para o jogo. O técnico do Timão colocou em campo a seguinte escalação para iniciar o amistoso: Jairo; Zé Maria, Amaral, Djalma, Wladimir; Basílio, Biro-Biro, Sócrates; Gil, Toninho e Wilsinho. Durante o jogo, também entraram no Alvinegro o lateral Luís Cláudio e o centroavante Geraldão. O único gol do amistoso foi marcado por Gil, apelidado de Búfalo Gil pela torcida, aos 30 minutos do primeiro tempo.
Foto: Acervo do jornal “A Notícia” disponibilizado por Fernando Wanner e Anderson Adriano
“O importante é que nós cumprimos a nossa missão, resultado positivo, 1 a 0, e hoje, vendo que terá outro Corinthians x Argentinos Juniors, essa lembrança não se apaga jamais”, afirmou Basílio.
Não foi com a camisa do Timão e de Argentinos Juniors que Sócrates e Maradona se enfrentaram, mas o encontro aconteceu nem dois meses depois do amistoso, quando os dois estavam representando seus países. Em 1981, a FIFA organizou um minicampeonato mundial de seleções, em comemoração aos 50 anos da 1ª Copa do Mundo. No Uruguai, no dia 4 de janeiro, Brasil e Argentina mediram forças pelo “Mundialito”, e o resultado foi empate, 1 a 1.
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