Pandemia fez com que o burnout fosse reconhecido como uma doença ocupacional e escancarou o problema.
Dois em cada três brasileiros estão estressados no trabalho, aponta um estudo conduzido pela International Stress Management Association, no Brasil (ISMA-BR), que mostrou ainda que, 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a síndrome do burnout. Isso coloca o país no segundo lugar do ranking de número de casos, atrás apenas do Japão.
O conceito de burnout foi definido pelo psicólogo americano Herbert Freudenberger nos anos 1970, que o descreve como uma reação de esgotamento físico e mental decorrente das atividades no trabalho.
Em 2022, após a pandemia da Covid-19 e seus impactos no bem-estar mundial, a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a reconhecer e classificar o burnout como uma doença ocupacional. Com a mudança, colaboradores passaram a poder entrar oficialmente com pedidos de afastamento para tratar os sintomas.
“O estresse faz parte da vida. Respirar, fazer uma atividade física, absolutamente tudo já coloca o corpo em estresse. Mas qual é a diferença? No esgotamento, a pessoa não volta ao estado de equilíbrio do organismo. Por mais que ela descanse, a exaustão não passa”, explica Danielle Costa Vieira, psicóloga da Alice, operadora que oferece plano de saúde empresarial.
Ela detalha ainda que o diagnóstico para a síndrome é avaliado em três dimensões amplas. A primeira é a exaustão emocional, uma sensação de estar esgotado, tanto física como emocionalmente. A segunda é denominada despersonalização ou cinismo, uma reação negativa ou colocar uma distância excessiva em relação às pessoas que deveríamos cuidar ou nos envolver. Por último, é analisada a baixa realização pessoal, composta por sentimentos de incompetência e perda de produtividade.
Quanto aos sintomas, a especialista lista os mais comuns, que podem variar de pessoa para pessoa, sendo eles exaustão, insensibilidade, irritabilidade, baixa concentração nas atividades, distúrbios de sono, apatia e sintomas físicos que não passam, como dores musculares ou de cabeça e até problemas respiratórios e de imunidade.
“Quando a pessoa começa a perceber que tem algo errado acontecendo com ela, afetando a funcionalidade e o índice de satisfação com a vida, ela deve procurar ajuda. Outro ponto para prestar atenção é observar se os sintomas persistem”, completa.
Como perceber se um funcionário está com problemas?
Gestores treinados com uma escuta ativa e atitudes de empatia são fundamentais para perceber se um funcionário está demonstrando alguns dos sintomas listados.
Outros sinais de mudanças de comportamento que podem ser notados são perda de funcionalidade e produtividade, alterações no humor, isolamento na relação com os colegas, relatos de estresse excessivo e se a pessoa era participativa e deixa de ser.
Empresas estão dando atenção à saúde mental?
Segundo a psicóloga Danielle Costa Vieira, em sua experiência na clínica, além do burnout, sintomas relacionados à ansiedade e à depressão também têm tirado os trabalhadores de suas funções laborais. “Estresse, cansaço e transtornos mentais são atualmente as principais causas de afastamento das atividades do trabalho.”
Aliado a isso, desde a pandemia e a predominância do home office, houve um aumento no abuso do uso de substâncias, como bebidas alcoólicas e tabaco, pontua a especialista.
Nos últimos anos, bem-estar e saúde mental entraram de vez nas prioridades das equipes de gestão de pessoas.
Uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas divulgada em abril deste ano ouviu 572 profissionais para entender como as empresas vinham cuidando (ou não) da saúde mental de seus funcionários.
Segundo os pesquisadores, a principal conclusão é: “a resposta inicial das empresas à demanda por cuidado à saúde mental se baseia na implementação de diferentes benefícios aos funcionários”. Entre eles, mindfulness, ioga, alongamento e programas de saúde mental.
No entanto, essa solução nem sempre é vista como suficiente pelas equipes e há divergências entre o que a empresa comunica e o que é aplicado no cotidiano.
Além disso, o estudo evidenciou que o papel dos gestores e das lideranças é crucial na articulação de qualquer política de saúde mental.
O que as empresas podem fazer para evitar o burnout?
Segundo Danielle Vieira, algumas medidas podem ser adotadas pelas empresas para prevenir o problema entre as equipes. A recomendação é rever a cultura de trabalho da empresa; oferecer espaços de convivência dentro das empresas e momentos para pausas.
Além dessas ações, encoraja-se as empresas a estabelecer limites razoáveis para prazos; estimular programas de apoio ao bem-estar, como a oferta de planos de saúde aos colaboradores, incentivar os funcionários a terem uma comunicação aberta entre as equipes, ofertar apoio psicológico, dependendo do tipo de trabalho executado, e treinar os gestores para uma escuta ativa e para desenvolver a empatia.
“Se um gestor não tem autoconsciência e autogerenciamento das próprias emoções e atitudes, como ele poderá compreender o outro?”, questiona.
Como os colaboradores podem lidar com o problema?
Colaboradores também podem se valer de dicas para enfrentarem situações difíceis e prevenirem os casos de afastamentos. Entre as recomendações, estão saber dizer “não” e dar limites para não gerar uma sobrecarga excessiva; exercitar o mindfulness em práticas que ajudem a trabalhar o foco; meditar para ajudar no relaxamento e fazer treino respiratório, para reduzir o estresse.
Outras atitudes são válidas, como agradecer – quando a pessoa consegue reconhecer uma coisa boa por dia, ela ativa uma área do cérebro que libera dopamina –; fazer exercícios físicos regulares e alongamento; estar em grupo ou fazer atividades como ler um livro; buscar ajuda de um profissional para acompanhamento quando necessário; monitorar os hábitos com um planner para construir uma rotina saudável e entender que coisas ruins passam.
A volta do funcionário afastado por burnout, Vieira pontua, deve inspirar cuidados. Além de ser um retorno gradual e mediante uma avaliação, a pessoa também pode se beneficiar de flexibilidade de horários e de uma readequação da rotina, como assumir uma nova função ou mudar de departamento.