De todas as lições que tenho aprendido nesta experiência fantástica em São Luís e na cidade de Timon, divisa do Maranhão com Piauí, a de um violonista, cantor e compositor, Chiconô, me chamou atenção. Ele me dedicou um hino que pede para aprendermos a ouvir o silêncio, a voz do coração.
Pontual, sim, ao extremo. Afinal de contas estamos na chamada “Jamaica brasileira”, a terra do reggae inspirado – acreditem – pelas ondas das rádios do Caribe, na década de 1970 (eu não era nem nascido), que traziam também outros ritmos, como calipso e zouk.
O som é difundido por mais de 200 “radiolas”, grupos musicais organizados ao redor de DJs e paredes de som que chegam a ter até 40 amplificadores. Uma tradição em meio a tradições.
Sabe aquela coisa que só o rádio consegue explicar? Assim argumenta o historiador Kavin Paulraj em seu doutorado sobre o tema: “Entusiastas de ondas curtas dos estados do Maranhão e do Pará captando sinais caribenhos”.
O som das radiolas chega longe com o vento que sopra do mar, une, aos tons azuis do céu maranhense, a religiosidade, o misticismo, os ritmos, a beleza e a riqueza de elementos culturais produzidos aqui: a festa de São João, o Bumba Meu Boi, o Tambor de Crioula, a Festa de São Gonçalo. Haja fôlego!
Tem que aprender mesmo a ouvir o silêncio, afinal nele está o pensamento, a sabedoria do espírito. Nesse universo, saem as palavras verdadeiras. O silêncio é mágico, são passos dados em busca de conhecimentos.
A cidade de São Luís é mágica. Pra você ter uma ideia, a vida de pescadores e ribeirinhos é regida pela variação das marés. Em apenas seis horas, a diferença entre preamar e baixa-mar pode chegar a 8 metros. A Baía de São Marcos é um dos melhores exemplos desse fenômeno. Dizem que o acreano é enjoado, imagine o maranhense, que tem a maior variação de marés do Brasil e a terceira maior do mundo.
Tantos mistérios e tantas culturas só podiam exportar grandes mestres. Homens sábios. De São Vicente de Ferrer saiu o Mestre Irineu, em 1909. Após 18 anos embrenhado na floresta, fundou a doutrina do Daime, mundialmente conhecida. Daqui também saiu Daniel Pereira de Matos, tocador de violino, primeiro músico da doutrina do Daime, mais tarde fundador da linha espiritual conhecida como Barquinha.
Aqui onde a escravidão viveu tristes capítulos, o mar com tons meios esverdeados, com uma coloração de musgo, parece pintar o passado. Ainda bem que Deus fez a liberdade.
O paraíso está logo ali, fenômeno único das lagoas interdunares à beira-mar. Não tem como não se emocionar. A imensidão dos Lençóis Maranhenses imprime toda liberdade dada ao seu povo. Os seus 155 mil hectares transformam esse ambiente no maior parque de dunas do Brasil. Uma sensação enorme de respirar a pureza.
Sustentabilidade. Às margens do rio Parnaíba, o mais importante afluente da bacia hidrográfica da região, ainda é possível encontrar árvores com quase 350 anos, como o tamboril, que ajuda na construção de barcos e canoas.
Como compôs e canta o violonista Chiconô: “Aqui é possível ouvir o silêncio, a voz do coração”.
Jairo Carioca é jornalista, escritor e assessor de imprensa