O dia da fundação do Santos Foot-Ball Club: sonho ou realidade?
Diuturnamente, debruço-me na sala do Centro de Memória e Estatística do Santos Futebol Clube sobre a centenária história do melhor time de futebol de todos os tempos. Talvez por isso, meu subconsciente fez com que tivesse um sonho maravilhoso noutro dia.
Nele, sonhei que estava presente na pioneira reunião, na qual se fundou o clube que honra o nome da cidade que carrega com orgulho e altivez desde o seu nascimento: o Santos Futebol Clube. Fui levado a esse encontro pioneiro por meu avô, Raimundo Gomez, um espanhol, oriundo da Galícia, que chegou a Santos no ano de 1909 e aqui se fixou, trabalhando como tintureiro até falecer. Nesse meu fantasioso sonho, era um menino ainda imberbe usando calças curtas, no esplendor da adolescência, que para mim tinha início.
O local da reunião era o salão de festas do Club Concórdia, na antiga rua do Rosário, 18, na parte superior da padaria Suissa. Meu falecido avô não participou da reunião, preferindo ir prosear no Largo do Rosário, com alguns amigos portuários, de folga na tarde daquele distante domingo de outono.
Observei Raymundo Marques e Argemiro de Souza Júnior darem início ao encontro. Senti a ausência do organizador de nome Mario Ferraz de Campos, que não se fazia presente na ocasião, motivo pelo qual não é considerado como um dos fundadores do clube, e é o primeiro associado do clube a pedir demissão no mês seguinte a fundação.
Ouvi atentamente a fala de Raymundo Marques, um esportista nato, que jogara futebol em algumas equipes da cidade e, pelo fato de todas elas deixaram de existir, desejoso de fundar um clube destinado à prática do futebol, como dizia o comunicado publicado no jornal Diário de Santos, do dia 09 daquele mês de abril e que entraria para a história mundial, não só pela fundação do clube praiano, como também pelo naufrágio do Titanic, naquela noite de 14 de abril de 1912:
“Varios sportsmem desta cidade estão empenhados em organisar um poderoso club de football, tendo já para isso, conseguido um vasto e esplendido terreno de propriedade de J.D. Martins, a rua Aguiar de Andrade, no Macuco, onde sera installado o ground da nova sociedade sportiva. A commissão organisadora do clube compoe-se dos tres esforçados cavalheiros seguintes: Mario Ferraz, Raymundo Marques e Argemiro de Souza Junior. Essa commissão, no desempenho da ardua tarefa que se impoz, esta percorrendo o nosso alto commercio para a acquisição de sócios, tendo já conseguido alistar para mais de 200 pessoas. No próximo domingo, as 2 horas da tarde, havera uma reunião na sede do Club Concordia, para serem apresentadas as bases do novo clube, eleita a sua directoria e tomadas outras deliberações attinentes aos fins da nova aggremiação sportiva. Era já sensível a falta, entre nós, de um bom clube dedicado ao bello sport do football. Acreditamos que o novo clube venha preencher essa lacuna”.
Lembro de ter visto, em um canto do salão, o jovem Urbano Villela Caldeira usando um terno de linho branco com o seu inseparável chapéu de palheta. Mas, como? (esse meu sonho está ficando confuso), Urbano Caldeira só se filiou ao clube em janeiro do ano seguinte! E, daí? O sonho era meu e nele poderia incluí-lo, fazendo justiça ao maior abnegado que o Alvinegro já teve desde os seus primórdios.
Não vi nessa assembleia, o primeiro presidente, Sizino Patusca, já que fora convidado para ser o mandatário máximo, dias antes por Raymundo Marques, e aceitara o convite. Também não vi Oswaldo nem seu irmão Arnaldo Silveira, considerados fundadores, conforme a reunião do Conselho Deliberativo, de 1929.
Ao todo no salão estavam 37 participantes, considerando que os dois irmãos Silveira são reconhecidos como fundadores, então o clube tem na realidade 39 sócios-fundadores. Ainda naquela tarde foi decidido que o novato clube teria suas camisas em listras verticais azuis e brancas com frisos dourados. Após breve discussão se aprovou a sugestão de Edmundo Jorge de Araújo, filho do dr. Sóter de Araújo, que sugeriu o nome de Santos Foot Ball Club, indicação aprovada por unanimidade e abençoada eternamente por todos nós santistas, nascidos ou não na terra de Brás Cubas, que verdadeiramente amam o clube da Vila Belmiro, Alvinegro a partir de 1913.
Quando meu sonho surrealista chegava ao fim, ouvi de Raymundo Marques e Urbano Caldeira a profecia de que aquele novato clube um dia haveria de ter em seu time o melhor jogador de todos os tempos e que aquela neófita agremiação seria várias vezes campeã de Santos, de São Paulo, do Brasil, da América e de todo o planeta Terra.
Para que isso possa sempre acontecer, o nosso Santos precisa viver eternamente sem ódio, sem rancor e com a união de todos aqueles que realmente querem o bem do Santos Futebol Clube.
Texto escrito por Guilherme Gomez Guarche