Enquanto o governo tenta atrasar o processo de impeachment no Senado Federal e a oposição vai cozinhando um a um os nomes do próximo executivo nos bastidores, à superfície Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB) prosseguem numa guerra de palavras perante as imprensas brasileira e internacional. “É golpe”, repetiu ontem a presidente numa cerimónia na Bahia. “Não há golpe”, havia dito na noite da véspera Michel Temer aos microfones da CNN.
© REUTERS/Carlo Allegri Dilma esteve na semana passada na ONU para assinar o acordo de Paris sobre o clima“Que conspiração é que eu estou a liderar? Eu tenho poder sobre 367 deputados? Sobre mais da metade da população do Brasil que, segundo as sondagens de opinião, deseja oimpeachment? Com todo o respeito pela opinião da presidente, ela está errada, não há golpe, não há conspiração”, disse Temer.
“A minha proposta é que haja um governo de salvação nacional, um caminho de pacificação e reconciliação, unindo todas as partes, incluindo a oposição, de forma a que a economia volte a entrar nos trilhos e a que cheguemos às eleições de 2018 sem incidentes.” O vice acredita que se formar “um bom gabinete” poderá demover os que também o querem destituído e que são, de acordo com as sondagens, a maioria da população.
Horas depois, Dilma afirmou enquanto entregava 2800 unidades habitacionais em Salvador no âmbito do programa Minha Casa, Minha Vida que os crimes de que é acusada – as pedaladas fiscais, ou seja, manobras orçamentais – têm sido usados “por todos os governantes do país desde 1994” mas que “só agora é que se tornaram crime”. “E o mais estranho é que quem me julga é um corrupto, com contas no estrangeiro e acusado pelo procurador-geral da República”, continuou, a respeito do presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB), investigado na Lava-Jato e no Conselho de Ética da própria câmara.
Mais tarde disse que “o impeachment é uma tentativa de fazer uma eleição indireta de quem não tem votos, de quem quer chegar ao poder sem eleições”. “O que eles querem é chegar e sentar-se na minha cadeira mas sem votos, esse é que é o problema”, continuou.
Eleições na agenda
As referências a “votos” e a “eleições” podem ser sinal daquilo a que a imprensa brasileira vem dando eco nos últimos dias: de que o PT, consciente da virtual derrota no Senado Federal, onde está agora a ser analisado o processo de impeachment, tenta convencer Dilma a optar pelo discurso das eleições antecipadas. Quase impraticável dos pontos de vista constitucional e jurídico, essa ideia agradaria, no entanto, a 62% da população, segundo sondagem do instituto Ibope, e ao próprio partido do governo, já que em pesquisas de opinião do instituto Datafolha, é Lula da Silva quem segue na frente das intenções de voto na maioria dos cenários.
Marina Silva (Rede), também com boas perspetivas nas sondagens, alas do PMDB mais próximas do governo e observadores internacionais têm avançado também com essa solução.
Foi num tom eleitoral que, a seguir à presidente, discursou o governador baiano Rui Costa (PT) para quem “o golpe é de uma elite endinheirada e perversa que não gostou que nos governos Lula e Dilma o povo do nordeste tivesse vez, voz, água, comida, dignidade e casa para morar”.
Entretanto, no Senado, a comissão de 21 deputados que analisa o impeachment confirmou a eleição de Raimundo Lira (PMDB) e Antonio Anastasia (PSDB) como presidente e relator, respetivamente. O nome de Anastasia, o braço direito do presidente do PSDB Aécio Neves, foi contestado pelo PT mas, por 15 votos a 6, acabou eleito, num sinal de que a oposição controla a votação na comissão da câmara alta, penúltimo estágio para a destituição de Dilma.
Por isso, no Palácio Jaburu, residência oficial de Temer, o novo governo já começa a formar-se. A dúvida é se com a participação do PSDB, como defendem o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o senador José Serra, ou sem, como pretendem Aécio Neves e Geraldo Alckmin. Tanto Serra como Aécio e Alckmin são pré-candidatos tucanos às presidenciais de 2018 e por isso calculam milimetricamente cada passo dado até lá.
Fonte: MSN