Nesta quarta-feira (8/9), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil enviou parecer ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, a respeito da inconstitucionalidade da Medida Provisória 1.068/2021.
A MP altera a Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), para, dentre outras disposições, limitar a atuação espontânea e extrajudicial — isto é, sem ordem judicial — dos provedores de redes sociais para a remoção ou indisponibilização de conteúdo e suspensão de contas de usuários, seja em decorrência de violação à lei, seja em razão da violação ao contrato que rege a relação privada com os seus usuários.
Os artigos 8-B e 8-C da MP estabelecem uma lista exaustiva de hipóteses que caracterizariam justa causa para a atuação espontânea das plataformas, a possibilitar, sem intervenção judicial, a suspensão de contas ou perfis ou de conteúdo.
Diante disso, a OAB argumenta que o objetivo da medida é coibir que os provedores de redes sociais possam agir espontaneamente para combater verdadeiras manifestações abusivas e ilegais contra a ordem democrática, o processo eleitoral ou a saúde pública que sejam, contudo, simpáticas às preferências do governo atual.
Segundo o parecer, o primeiro vício da MP está na ausência de requisitos para sua edição. O presidente da República pode, apenas em situações de relevância e urgência, editar medidas provisórias, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
“A carência de qualquer um dos requisitos elencados no artigo 62 da Constituição Federal torna a medida provisória inconstitucional e um instrumento de poder que visa a satisfação dos anseios do Poder Executivo, ferindo, dessa forma, os princípios norteadores de qualquer Estado Democrático de Direito”, ressaltou a OAB.
Para a OAB, o Poder Executivo não apresentou nenhum dado objetivo que permitisse qualquer conclusão quanto a urgência da alteração de temas de governança da internet debatidos tão intensamente pela sociedade. A MP também não informa qual teria sido a situação crítica ensejadora de tal intervenção imediata, excepcional e gravosa na esfera dos direitos individuais, apontou o parecer.
Dessa forma, a Ordem alega que a medida provisória, além de fundamentada em premissas incorretas e/ou falaciosas, não demonstrou a presença dos requisitos de relevância e urgência a permitir o exercício excepcional da competência legislativa pelo presidente, logo é formalmente inconstitucional.
Inconstitucionalidades materiais
Toda e qualquer iniciativa regulatória que se destine a interferir nos modelos de negócios deve respeitar a livre iniciativa e a livre concorrência, diz a OAB. Segundo o parecer, o Marco Civil da Internet consagrou a livre iniciativa como um dos fundamentos da disciplina do uso da internet, em decorrência disso, os provedores podem estabelecer políticas claras sobre as condições de uso dos seus serviços, com a criação de mecanismos de denúncia e avaliação do conteúdo que é gerado dentro das plataformas.
A Medida Provisória interfere na atividade econômica privada e no direito de livre iniciativa e a estruturação e gestão do modelo de negócio dos provedores de redes sociais ao proibi-los de aplicarem suas políticas de uso, sustenta o parecer. Essa interferência estatal, sem a mínima justificativa razoável, estaria violando a Constituição.
“Concretamente, ao limitar a atuação das plataformas apenas para as hipóteses consideradas como justa causa elencadas nos artigos 8-B e 8-C, a Medida Provisória, de maneira absolutamente injustificável e desproporcional, interfere na liberdade de contratar, que é corolário da livre iniciativa, das plataformas com seus usuários”, completou.
Além disso, para a Ordem, ao limitar a moderação do discurso de ódio restringindo a possibilidade de moderação aos casos de violência ou ameaça ou quando configurar crime sujeito a ação penal incondicionada, a Medida Provisória impede a atuação das redes sociais na prevenção e repressão aos atos de preconceito ou de discriminação.
Por fim, a OAB entende que a MP viola o sistema normativo ao tratar a liberdade de expressão como um direito absoluto, sendo esse justamente um dos grandes perigos dessa garantia que deve ser conferida a todo ser humano.
“Ao assim dispor, a Medida Provisória pressupõe que a atividade de moderação de conteúdo das plataformas tenha natureza de censura privada. Mas, em verdade, o que se pretende com tal dispositivo é permitir que toda e qualquer decisão de moderação de conteúdo seja questionada, abrindo-se verdadeiro abismo sem fim para toda e qualquer suspensão de contas ou perfis e remoção de conteúdo que contrariar os interesses daqueles que, sabidamente, disseminam conteúdo ilícito”, conclui o parecer.
Fonte:Conjur