Nome em evidência após a proposta de compra de cerca de R$ 20 milhões feita pelo Atlético-MG ao Vasco, o atacante Marrony é tratado como um “bilhete premiado” há tempos. Aos 21 anos, por exemplo, o jovem já tem seus direitos econômicos fatiados em três partes, em uma operação que ainda demanda maiores explicações. O Vasco, em seu balanço mais recente, mantém a informação de ter 70% do atacante. Já o Volta Redonda, até 2018, dizia ter 30% em seu documento financeiro, algo que passou para 20% em 2019. Mas afinal: Para onde foram parar os 10% restantes? A reportagem do UOL Esporte, então, entrou em contato com o clube da “Cidade do Aço” e ouviu de seu vice-presidente, Flávio Horta Júnior, que o clube negociou tal porcentagem. “Quando o Volta Redonda passou o Marrony para o Vasco, existia a possibilidade de cessão de crédito de 10% a um parceiro, algo que foi feito entre 2017 e 2018, se eu não me engano”, disse. O UOL Esporte teve acesso a um contrato que, supostamente, remete ao documento desta tratativa. Intitulado de “instrumento particular de cessão de crédito”, ele é datado de 2018 e cita, nominalmente e com todos os dados pessoais, Volta Redonda, Marrony e a pessoa física que teria comprado esse percentual no valor de R$ 100 mil à época. Trecho do contrato que, supostamente, seria o de cessão dos 10% de Marrony O homem citado é um empresário, com endereço no Rio de Janeiro, e registro no CRECI-RJ (Conselho Regional de Corretores de Imóveis), mas sua assinatura não consta no documento. O UOL Esporte tentou contato, mas não obteve respostas. A reportagem, então, informou a Flávio Horta Júnior sobre o acesso a este contrato e perguntou se o empresário citado na documentação é, de fato, quem comprou os 10% dos direitos econômicos do jogador. Como resposta, o dirigente do Volta Redonda foi inconclusivo: “Pode ser, sim”. Questionado se o negócio havia sido feito com uma empresa de agenciamento de jogadores, negou: “Não foi para pessoa jurídica, não. Foi para pessoa física”. Em seguida, Horta fez questão de citar o termo “instrumento particular de cessão de crédito” ao classificar a operação: “Esse é o termo exato”. O UOL Esporte procurou também pessoas ligadas ao atual gerenciamento da carreira de Marrony, que disseram desconhecer quem seria o dono destes 10% “desaparecidos”. Operação ilegal? A reportagem apresentou o contrato a um advogado especialista em direito desportivo. Carlos Eduardo Ambiel ressaltou que tal transação pode gerar punições esportivas, uma vez que fere regras impostas pela Fifa e também pela própria Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Desde 2015, o artigo 18 do Regulamento sobre Status e Transferência de Jogadores (RSTP) indica que os direitos econômicos dos atletas não podem estar sob o controle de terceiros, apenas clubes estão aptos e envolvidos nas transferências de jogadores. A intenção da entidade máxima do futebol era de diminuir o papel de intermediários nos negócios. No ano passado, os atletas passaram a não são mais considerados terceiros em relação aos próprios direitos econômicos, podendo ter participação sobre eles. Trecho do suposto contrato de cessão dos 10% dos direitos econômicos de Marrony “De fato, o documento que existe aqui é uma cessão de crédito de um percentual de uma transferência do atleta, feita já em 2018, para um terceiro. E isso fere expressamente o regulamento da Fifa e o regulamento interno da CBF. Talvez, o clube tenha confundido, achando que cessão de crédito, como está previsto no direito brasileiro, pode. Mas a cessão de direito econômico é, justamente, uma cessão de crédito e isso, no âmbito esportivo, está proibido. Esse documento, com essa data, e essas condições, a chance de uma punição esportiva é enorme. É clara infração ao regulamento”, disse Carlos Eduardo Ambiel. Como última cláusula do documento ao qual o UOL Esporte teve acesso, há uma ressalva indicando que tal contrato está sob as leis do Código Civil brasileiro: “Cláusula décima primeira: Aplicam-se a esse contrato as leis da República Federativa do Brasil, em especial o Código Civil”. Flávio Horta Júnior, por sua vez, assegura que toda a transação foi feita dentro da legalidade e salientou que a operação teve o aval dos poderes do Volta Redonda: “Com certeza, tanto que foi aprovada nos últimos dois anos pelos Conselhos Deliberativo e Fiscal”. Fonte: UOL
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