A superação de quatro décadas de declínio da indústria na economia brasileira é o principal objetivo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial, que voltará a funcionar em 25 de maio (Dia da Indústria), após sete anos de inatividade. O anúncio foi feito pelo secretário-adjunto do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Felipe Augusto Machado, durante audiência na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (9).
Segundo ele, a intenção é discutir com a sociedade civil e o setor privado a retomada da relevância do Estado na definição de políticas públicas de longo prazo. Também serão considerados os contextos de liderança chinesa em alguns setores e guerra na Europa, além da tendência mundial de incentivos à tecnologia e à produção de bens com menor impacto ambiental.
Machado citou metas do ministro Geraldo Alckmin para o crescimento industrial do País a partir de atributos como tamanho territorial e bom histórico de políticas públicas de energias renováveis. “Nas palavras dele (Alckmin), não seria uma reindustrialização, mas uma neoindustrialização: uma industrialização em novas bases, porque estamos falando de uma mudança radical de paradigma tecnológico”, afirmou. Ele acrescentou que não é possível não pensar de forma estratégica nesse setor.
A audiência foi realizada na Comissão de Indústria, Comércio e Serviços por iniciativa do presidente do colegiado, deputado Heitor Schuch (PSB-RS), disposto a discutir a reindustrialização e a descarbonização da matriz produtiva do Brasil. Segundo ele, o propósito é fazer do Brasil um líder global da descarbonização e da temática da transição energética.
“Estive na China, na comitiva do governo brasileiro, e o que mais ouvi falar foi em bio, eco, ESG (governança social e ambiental) e sustentabilidade. Precisamos, com certeza, agregar valor às cadeias produtivas. Exportar commodities, grão de soja, boi em pé não é a melhor sistemática”, avaliou.
Declínio e retomada
Dados apresentados pelo economista Jackson de Toni mostram que, entre 2013 e 2019, o Brasil perdeu 28.700 indústrias e 1,4 milhão de postos de trabalho no setor. Hoje a indústria de transformação responde por apenas 11% do PIB e 24% da receita tributária federal.
Para o professor Luís Felipe Maldaner, da Escola de Gestão e Negócios da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos-RS), o declínio da indústria tem sido evidente, mas o setor ainda sustenta uma estrutura capaz de retomar a relevância, sobretudo com o apoio de entidades como BNDES e Apex.
“A política industrial deve estar no coração da política de desenvolvimento, lembrando que não é a monocultura que distribui renda. É a indústria que distribui renda”, afirma Maldaner.
O diretor-executivo da Federação Global de Conselhos de Competividade, Roberto Alvarez, citou o exemplo da indústria líder mundial em carros elétricos para apontar possíveis caminhos da reindustrialização brasileira.
“É fundamental trazer empreendedorismo para a equação. A próxima Tesla pode ser criada no Brasil e escalar globalmente. Tem três oportunidades que talvez pudéssemos pensar: as alavancas da digitalização e da descarbonização, a ideia de resolver problemas e omissões e (identificar) quais são as tecnologias que crescem hoje e para as quais o Brasil pode ter uma janela”, disse.
Alvarez acrescentou que políticas industrias precisam de ambiente macroeconômico estável e ações de longo prazo, independentes dos ciclos de governos.
Iniciativas
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentou aos deputados cerca de 60 propostas de redução do “custo Brasil” e de melhoria do ambiente de negócios. Elas fazem parte do Plano Nacional de Retomada da Indústria, que acaba de ser lançado pela CNI com quatro missões prioritárias, entre elas descarbonização e transformação digital.
A Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) sugeriu um programa temporário de oferta de energia a indústrias com capacidade ociosa e defendeu a aprovação do projeto de lei (PL 4012/21) que reduz, no setor, o impacto negativo da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Já a Associação Brasileira de Biogás (Abiogás) se apresentou como “indústria descarbonizada, verde e nacional”, porém com apenas 2% do potencial aproveitado atualmente.