Integrantes do Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional defenderam que uma eventual legislação sobre inteligência artificial (IA) leve em conta o impacto das tecnologias no trabalho, como a eliminação de cargos. O assunto foi discutido em audiência pública do Conselho nesta segunda-feira (2).
A ideia é que o Conselho – órgão de assessoramento do Congresso Nacional para temas ligados à comunicação social – possa instruir os parlamentares sobre o tema.
Está em análise no Senado Federal projeto de lei (PL 2338/23) que regulamenta a inteligência artificial, apresentado pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente da Casa. O projeto é resultado do trabalho de uma comissão de juristas que analisou, em 2022, outras propostas relacionadas ao assunto, além da legislação existente em outros países.
A conselheira Maria José Braga, representante dos jornalistas, disse estar preocupada com a exclusão gerada pela inteligência artificial e com o impacto dela no mercado de trabalho. “Apesar de gerarem outro tipo de necessidade e de trabalho, as tecnologias geram exclusão”, disse. Ela lembrou que as tecnologias substituem trabalhadores e defendeu a regulação da IA com parâmetros para que haja evolução sem exclusão.
A preocupação com a eliminação de cargos também foi levantada pela representante dos trabalhadores em cinema e vídeo, Sonia Santana. “Como será a preparação de novos profissionais, quais novas funções existirão, e que política pública será gerada para sustentar as pessoas que perderem seus cargos? Como elas poderão ser atualizadas e requalificadas, se isso é possível?”, questionou.
Para ela, a autorregulação da IA pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária é insuficiente. Ela defendeu a regulação com viés ético, para respeito, por exemplo, dos direitos autorais.
O conselheiro José Antônio de Jesus da Silva, representante dos radialistas, reforçou a importância de que regulação da IA não exclua ainda mais trabalhadores. Segundo ele, câmeras e editores já estão deixando de existir no mercado.
Regulação flexível
A representante da Associação Brasileira de Anunciantes, Sandra Martinelli, defendeu o incentivo à inovação responsável, com preservação de direitos autorais, a autorregulação setorial e uma regulação da IA “suficientemente flexível e adaptável”, permitindo experimentação, inovação e evolução. Para ela, a regulação deve ser principiológica.
Sandra Martinelli destacou que a IA já permeia e revoluciona o processo publicitário, mas que a transparência é importante. Ela lembrou que o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) arquivou processo, aberto em julho, para avaliar se campanha da Volkswagen feita com inteligência artificial feria o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária.
O vídeo simulava um dueto entre Elis Regina, morta há 41 anos, e a filha dela, Maria Rita. A propaganda utilizou uma técnica conhecida como “deepfake”, que faz montagens realistas com rostos de pessoas, e não é regulada hoje no Brasil. O Conar considerou que o uso da ferramenta estava evidente na peça publicitária.
O advogado especialista em Direito de Propriedade Intelectual Ygor Valério defendeu uma regulação pontual da IA, com consulta aos segmentos afetados antes de uma regulação mais ampla.
“A tendência de tentar regular o ambiente de IA para fazer com que as coisas voltem ao que eram é muito perigosa. É muito importante considerar essa evolução tecnológica sob uma perspectiva positiva, tratando eventuais desvios sem impedir ou prejudicar o desenvolvimento da IA como ferramenta nas atividades de comunicação social”, opinou.
O executivo da O2 Filmes, Paulo Barcellos, também defendeu a regulação pontual para todos os setores, e não apenas para a publicidade e produção de filmes.
Direitos autorais
A representante do Conar, Andressa Bizutti, lembrou que a Lei de Direitos Autorais protege apenas a parte da obra criada por um ser humano; a parte criada por inteligência artificial seria de domínio público.
A regulação terá de avaliar se o treinamento das ferramentas de inteligência artificial com base de dados que inclui conteúdos de autores será considerada infração aos direitos autorais. Alguns países, como o Japão, decidiram privilegiar o desenvolvimento da IA, enquanto a Europa está focada em proteger os autores – mesmo viés do projeto em análise no Senado.
“A proposta brasileira coloca que não haverá ofensa aos direitos autorais em atividades feitas por organizações e instituições de pesquisa, jornalismo e museus, entre outras. Estamos mais focados em autorizar isso para fins de pesquisa e não de uma forma ampla, como aconteceu no Japão ou como pode acontecer nos Estados Unidos”, avaliou.
Para a representante do Conar, se o treinamento dos sistemas for limitado, será limitado também o desenvolvimento da inteligência artificial.