Participantes de uma audiência pública na Câmara dos Deputados demonstraram preocupação com o risco de rompimento da barragem de rejeitos Forquilha III, da companhia Vale S.A., em Ouro Preto (MG). Ainda que uma anomalia recente tenha sido sanada, parlamentares e especialistas disseram que a barragem demanda monitoramento permanente.
A situação da barragem foi debatida pela comissão externa da Câmara dos Deputados destinada a fiscalizar os rompimentos de barragens, nesta terça-feira (7), a pedido do deputado Padre João (PT-MG). “Uma notícia dessas afugenta outras atividades do município, como o turismo. As pessoas ficam com medo. Não tem a clareza de qual será a área. Fala-se em Ouro Preto, Itabirito, as pessoas já ficam assustadas”, afirmou o parlamentar.
Na audiência, o procurador da República Bruno Nominato de Oliveira, que participou de diligências em Forquilha III, disse que a barragem já deveria ter sido eliminada, ainda que o prazo para tanto acabe em 2035, por não possuir condição de estabilidade desde 2019. “O Ministério Público espera que o empreendedor adote medidas para acelerar o processo. Quem tem que resolver esse tipo de problema é quem pratica atividade econômica altamente poluente, que acarreta riscos para a pessoa. A empresa tem o dever de informar a população sobre o que está acontecendo”, defendeu Oliveira.
Vazamento
A anomalia detectada em março deste ano – o vazamento de material em um dreno, com quantidade significativa de ferro – foi corrigida. O problema ocasionou visita da Agência Nacional de Mineração (ANM) ao local e recomendações à Vale, inclusive à alta direção da empresa.
Na avaliação do superintendente de Segurança de Barragens de Mineração da ANM, Luiz Paniago Neves, a correção da anomalia funcionou mais como um “band-aid” do que como cura da doença. “Forquilha III está em nível 3 desde 2019. Quer dizer que está rompendo. A informação de fator de segurança não consegue evoluir. Dizer que está rompendo há cinco anos é controverso; mas, como não temos informações, a gente usa a prevenção. Então, continua em nível 3”, esclareceu Neves.
A barragem de Ouro Preto tem 77 metros de altura e armazena mais de 19 milhões de metros cúbicos de rejeitos. “Existe o risco, em caso de rompimento, de que outras barragens próximas se rompam por força do abalo”, pontuou Bruno de Oliveira.
A manutenção tem de ser feita por via remota, uma vez que há impedimento trabalhista de que os funcionários da Vale deem manutenção pessoalmente, por conta do risco de rompimento, que poderia, por exemplo, prejudicar o abastecimento de água em Belo Horizonte, além de causar outros prejuízos ambientais.
Questionamentos
Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, Daniel da Mota Neri questionou as condições para Forquilha III ter entrado em emergência em 2019 e os parâmetros nunca terem mudado desde então. “A Vale responde que a barragem está em nível 3 de emergência porque não pode fiscalizar, porque os trabalhadores estão impedidos de entrar na barragem”, disse Neri. “É preciso que os entes olhem para esses arranjos que a Vale, principalmente, vem fazendo em Minas Gerais. Não é possível que a gente acredite na boa fé do empreendedor que já matou 300 pessoas com o rompimento de duas barragens”, disse, em referência às barragens de Mariana (2015) e de Brumadinho (2019).
Ex-superintendente do Ibama em Minas Gerais, Júlio César Grillo acredita que, diante da falta de informações, o problema do dreno pode estar aumentando. “Não sabemos se a saída de minério voltará com as chuvas de fim de ano. Não sabemos o motivo real do problema encontrado no dreno”, disse.
Responsabilidade
O deputado Domingos Sávio (PL-MG), por outro lado, ponderou que a solução não deve passar por criar obstáculos para a mineração em Minas Gerais. “O processo de mineração deve ser feito com responsabilidade, sustentabilidade e investimentos que garantam a segurança das pessoas. Mas tenhamos a clareza de que a vida humana não prescinde da mineração. Não há como existirmos sem depender daquilo que advém da mineração”, afirmou.
Padre João lamentou a ausência de representantes da Vale e da Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais na audiência pública. “Era o momento de trazer esclarecimento para a população.”