Sob críticas de empresários gaúchos, os governos federal e estadual apresentaram na Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (7), o balanço das principais ações após um ano da tragédia de inundações no Rio Grande do Sul. O mais grave evento climático extremo do estado deixou 183 mortos e um rastro de destruição em 96% dos municípios gaúchos em maio do ano passado.
Esforços coletivos e uma onda de solidariedade nacional e internacional garantiram o socorro imediato às vítimas. Em audiência na Comissão Externa da Câmara, o secretário nacional de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, Maneco Hassen, detalhou a ajuda federal ao estado.
“O governo federal já aplicou no Rio Grande do Sul R$ 112 bilhões. Foram 430 mil famílias beneficiadas com o auxílio reconstrução, além de 112 mil trabalhadores beneficiados e 15 mil empresas favorecidas com R$ 314 milhões direto no caixa das empresas”, disse.
Segundo Hassen, a ajuda da União teve impacto positivo na economia gaúcha, que registrou crescimento de 4,9% no PIB estadual em 2024 (acima da expectativa inicial de 3,6%), aumento na arrecadação de ICMS (R$ 3,5 bilhões entre julho/24 e março/25) e queda de 0,8% na taxa de desemprego.
O secretário-executivo do Conselho do Plano Rio Grande, Clair Kuhn, apontou um fundo (Funrigs) recentemente criado a partir da suspensão do pagamento das dívidas do estado com a União como “pilar financeiro da reconstrução”.
“Calculamos que teremos, até agosto de 2027, em torno de R$ 14,3 bilhões a serem investidos. Se amanhã acontecesse outra enchente, nós certamente já estamos hoje bem mais preparados”, ressaltou.
A ajuda enviada pelo governo federal foi detalhada da seguinte forma:
- R$ 18 bilhões em repasse de recursos para os municípios;
- R$ 6,5 bilhões na construção de diques;
- R$ 1,8 bilhão em obras de infraestrutura;
- R$ 2,2 bilhões de auxílio reconstrução para 430 mil famílias;
- R$ 3,5 bilhões do Minha Casa Minha Vida, que disponibilizou 25 mil casas;
- R$ 31 bilhões no apoio a 66 mil empresas;
- R$ 8,9 bilhões de desconto e crédito rural para 229 mil produtores rurais; e
- R$ 1,4 bilhão em projetos de defesa civil.
O governo federal também participou de ações de abrigo da população em 99 municípios (R$ 30 milhões), proteção do emprego para 112 mil trabalhadores (R$ 314 milhões), além de apoio a 521 unidades de saúde (R$ 1,5 bilhão), 1.970 escolas (R$ 360 milhões), 104 mil cestas básicas (R$ 58 milhões) e retomada cultural (R$ 60 milhões).
Situação dos municípios
Os governos federal e estadual admitiram atrasos em algumas obras devido à falta ou a ajustes em projetos, sobretudo por parte das prefeituras. Já deputados da comissão reclamaram da situação financeira crítica em vários municípios e em setores produtivos. Para o deputado Osmar Terra (MDB-RS), os recursos não têm chegado efetivamente aos destinatários.
“São R$ 100 bilhões (do governo federal) mais não sei quantos bilhões do governo do estado, então, os problemas estão resolvidos. O que nós estamos fazendo aqui? Só que (o dinheiro) não chega”, rebateu.
Esse diagnóstico foi compartilhado pelos representantes das federações empresariais do Rio Grande do Sul que participaram da audiência na Câmara. Comércio (Fecomercio-RS) e varejo (Federação Varejista) apontaram endividamento das empresas. A federação das indústrias (Fiergs) cobrou ajuda do BNDES para superar perdas em logística, mão de obra e capacidade de produção em setor responsável por 55% do ICMS gaúcho.
Produtores rurais
Segundo o conselheiro da federação de agricultura (Farsul), Luís Pires, só em relação aos bancos, a dívida dos produtores rurais é de R$ 72,8 bilhões e 30% desse valor (R$ 22 bilhões) vencem neste ano.
“O valor bruto da produção agropecuária em 2025 vai ser de R$ 66 bilhões. Ou seja, todo o valor bruto da produção de grãos não paga o valor da dívida que nós temos hoje. O nosso estado está empobrecendo”, disse Pires.
Vice-presidente da federação da agricultura familiar (Fetag-RS), Eugênio Zanetti, agradeceu pelo socorro emergencial, mas reforçou o pedido de mais ajuda após o que chamou de “combo de safras frustradas” por secas ou enchentes sucessivas no Rio Grande do Sul.
“A ajuda veio para os agricultores, mas é muito pouco pelo tamanho da tragédia que assolou o nosso estado”.
Para o setor agrícola, os empresários pediram seguro rural amplo e ajuda com recursos do Fundo Social do Pré-Sal. Também houve consenso para a aprovação urgente de projetos de lei que tratam da securitização das dívidas do agro (PL 320/25, no Senado, e PL 165/24 e seis apensados, na Câmara). Algumas propostas da Câmara ainda são relativas à longa seca de 2023 e estão prontas para votação no Plenário.

Atuação parlamentar
O relator da comissão externa, deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), aproveitou a reunião para resumir a atuação dos parlamentares após a tragédia de inundação. Foram 17 reuniões, 119 convidados ouvidos e cerca de 100 projetos de lei apresentados por deputados de vários partidos.
“Mais do que relatar o que foi feito é a gente vislumbrar o que precisa ser feito. Nós temos no horizonte uma ação efetiva a respeito da questão do agronegócio”, afirmou.
Os parlamentares ainda aprovaram requerimentos do coordenador da comissão, deputado Marcel van Hattem (Novo-RS), para novas audiências públicas com focos na reconstrução do estado e na prevenção de novas tragédias.