A área econômica do governo minimizou o poder de big techs – grandes empresas de tecnologia e redes sociais como Meta, Google e Apple – de reduzir a concorrência e de impor custos ao consumidor em sistemas próprios de pagamentos, por meio de taxas ou barreiras de acesso externo. O assunto foi debatido pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.
Segundo o subsecretário da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Economia, Andrei Vilas Boas de Freitas, o problema deve ser menor no Brasil pela existência de um instrumento largamente utilizado pelos brasileiros e que não poderia ficar de fora das opções das empresas: o pix.
Para Freitas, problemas pontuais de dificuldade de acesso aos sistemas de pagamentos das big techs podem ser resolvidos com denúncias ao Cade. Mas os representantes de entidades de defesa do consumidor se preocupam com a formação de ambientes fechados nestas plataformas, que acabam “aprisionando” o usuário.
A representante do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Camila Leite Contri relatou casos, em outros países, de ações contra aplicativos de pagamento da Apple e Google por favorecimento de serviços próprios. Outra preocupação é com o uso dos dados das transações.
Criação de ambientes fechados
O chefe do Departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro do Banco Central do Brasil, Ângelo José Mont’Alverne Duarte, afirmou que os sistemas de pagamentos das plataformas digitais são autorizados pela autarquia. Mas disse que existe uma preocupação mundial com a fragmentação dos mecanismos de pagamentos. Ou seja: a criação de ambientes fechados que possam rivalizar com a moeda soberana do país – no nosso caso, o Real.
Estes ambientes poderiam favorecer, por exemplo, pagamentos relacionados ao terrorismo ou lavagem de dinheiro. Mas Duarte afirmou que, por enquanto, para os consumidores brasileiros, os sistemas das big techs têm sido abertos a diversas formas de pagamento.
“Essas carteiras digitais da Apple, do Android, no fundo você está trabalhando com um cartão de crédito. É só uma forma de facilitar, de reduzir os riscos na transação. O aplicativo passa a ser responsável pela identificação do usuário, agrega segurança e tem seu custo. Então eu não vejo isso um risco muito grande hoje no mercado brasileiro”, disse.
Pouca colaboração
O diretor-executivo do Procon de São Paulo, Guilherme Farid, disse que as preocupações com as big techs são agravadas pelo fato de que elas não estariam tendo uma atitude muito colaborativa com a defesa do consumidor no Brasil. Segundo ele, os questionamentos são sempre respondidos com a afirmativa de que o Marco Civil da Internet não traz a responsabilidade delas sobre isso.
Farid citou o exemplo de recentes denúncias de fraudes com celulares para transações via pix, usando as plataformas digitais.
“Chamamos aqui o Google para uma conversa no Procon. Não veio na primeira reunião, faltou na segunda reunião. Foi feita uma notificação ao Google, perguntando: ‘Vocês têm conhecimento de que fornecem serviços a celulares produto de crime?’ E a empresa respondeu oficialmente ao Procon: ‘Temos conhecimento de que fornecemos serviços a celulares produto de crime; entretanto, não temos obrigação legal de deixar de fornecer esses serviços’.”
O deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) lembrou que é relator de uma Proposta de Fiscalização e Controle sobre a atuação dos órgãos fiscalizadores do governo nos sistemas de pagamentos das big techs (PFC 69/21). O deputado Elias Vaz (PSB-GO), autor da proposta, disse que ficou claro na audiência que a regulação precisa melhorar.
“É preciso ter regulação e é preciso ter fiscalização. Exatamente por a gente ter o serviço de algumas empresas que dominam o mercado digital e elas terem uma situação desproporcional com outros segmentos econômicos. E isso pode gerar uma concorrência desleal”, disse.
As empresas Google, Apple e WhatsApp foram convidadas para a audiência, mas não enviaram representantes.