A preocupação com a sustentabilidade ambiental está nas novas legislações como um princípio, e não mais como escolha: licitações que não considerem esse quesito podem ser tidas como ilegais. A Câmara dos Deputados é pioneira no assunto: há 20 anos criou o Serviço de Sustentabilidade da Câmara, conhecido pela sigla Ecocâmara.
Em 2011, a Mesa Diretora publicou um ato com várias normas internas, tomando sustentabilidade não só pelo aspecto ambiental, mas também pelas vertentes social e econômica. O papel utilizado na Câmara, por exemplo, ao ser jogado fora é recolhido por cooperativas de catadores para ser reciclado.
A nova Lei de Licitações (Lei 14.133/21) reforça esse compromisso. Ela determina que, na contratação de obras, fornecimentos e serviços, inclusive de engenharia, haja uma remuneração variável à empresa contratada com base em critérios de sustentabilidade ambiental.
Daniel Morais, da coordenação de Contratações da Câmara, faz uma comparação: a lei anterior (Lei 8.666/93), que ainda vai funcionar junto com a nova até o final do ano, fazia apenas uma menção à sustentabilidade. Já a nova legislação tem 12 referências e considera os critérios de sustentabilidade antes da elaboração do edital, desde o estudo técnico preliminar.
“A decisão da melhor solução, da mais vantajosa para a administração, tem que considerar os impactos ambientais. E depois vai ter que descrever os impactos. E se, por acaso, aquela compra tiver algum tipo de impacto negativo, você ainda vai ter que prever as medidas mitigadoras”, explica.
Economia Verde
Para o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), coordenador da Frente Parlamentar da Economia Verde, é importante que um critério de desempate nas licitações seja o nível de qualidade ambiental do serviço a ser prestado. Ele elogia a valorização dos produtos com pegada ambiental positiva e dos processos que tenham compromisso com a sustentabilidade, além de enumerar as vantagens para o cidadão que utiliza os produtos e serviços resultantes dessas contratações.
“Primeiro: a população vai ter produtos e serviços que têm esse compromisso com a sustentabilidade. Segundo: o fato de ter essa marca faz com que o Brasil se aprofunde – porque nós temos muita convicção de que a sustentabilidade, que é uma exigência hoje no mundo, também é no Brasil. E o Brasil pode ser a vanguarda da nova economia, a economia de baixo carbono, a chamada economia verde”, diz.
O parlamentar tem um projeto que está sendo examinado na Câmara (PL 1817/22) modificando a Lei da Sociedade por Ações (Lei 6.404/76), a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei 6.438/81) e a nova Lei de Licitações para incluir itens como demonstrativos de riscos ambientais e atribuição de nota, nas licitações, às empresas que tiveram bom desempenho prévio em questões ambientais.
Tudo está dentro da chamada Pauta ESG, sigla em inglês para práticas ambientais, sociais e de governança, ligadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.
Arnaldo Jardim explica qual é o objetivo da proposta. “Fazer com que esses princípios de cuidado ambiental, preocupação social e regras de governança e transparência sejam cada vez mais orientadores não só das empresas, mas também dos órgãos públicos.”
Gastos públicos
De acordo com Daniel Morais, a nova Lei de Licitações exigiu regulamentações internas e, para isso, a Câmara criou um grupo de trabalho. Ele lembra que mudar as regras para as contratações pode significar não só a colaboração com a preservação do planeta, mas também uma redução do gasto público.
“O Estado brasileiro gasta em média 12% do PIB em compras públicas. Um estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) fala que parte desse gasto é desperdiçado. Então, nós estamos aqui diante de uma possibilidade de economia de recursos públicos que, no final, podem ser revertidos, por exemplo, para a educação”, aponta.
Daniel Moraes lembra que vários setores da administração pública já produziram materiais que podem ser úteis tanto para empresas privadas quanto para órgãos públicos. Ele cita o Guia Nacional de Compras Públicas Sustentáveis elaborado pela Controladoria-Geral da União (CGU), além de orientações publicadas pelo Ministério Público Federal e pela Advocacia-Geral da União (AGU).