O diretor de programa da secretaria executiva do Ministério da Agricultura, Luís Rangel, atribuiu à diplomacia o atual quadro de normalidade no abastecimento de fertilizantes no Brasil, mesmo em cenário de guerra na região que abriga as maiores reservas de insumos para o produto. Ele foi um dos convidados da audiência pública da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (28) para debater a instabilidade internacional no fornecimento de fertilizantes diante do conflito entre Rússia e Ucrânia.
Rangel informou que a primeira ação do governo foi direcionar o trabalho da diplomacia para a questão dos insumos e fertilizantes. “Deixou de agir na promoção do nosso agronegócio lá fora para garantir o abastecimento dos insumos que vinham de fora para dentro. Só da Rússia, nós aumentamos as importações em 70% no primeiro trimestre”, disse.
A estratégia foi elogiada pelo diretor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Reginaldo Minaré, que ressaltou a “acanhada” produção doméstica e a grande dependência do País em nitrogênio, fósforo e potássio (NPK) importados. Dados da CNA atualizados até maio mostram Rússia (22,9%), China (12,6%), Canadá (10,3%) e Belarus (5,4%) como as principais fontes dos fertilizantes usados no Brasil.
Ainda pairam dúvidas quanto aos reflexos da guerra na safra agrícola do hemisfério norte e nos preços internacionais dos insumos, o que leva Luís Rangel a manter o tom de alerta. “O sinal é amarelo. Apesar de todos os esforços, o preço dos fertilizantes disparou e isso foi dramático para o que chamamos de custo variável de produção”.
Com a alta nos preços, o papel dos fertilizantes subiu de 30% para até 43% nos custos de algumas lavouras. A audiência na Câmara foi organizada pelo deputado Bosco Costa (PL-SE). “A gente sabe que o agro vem dando grande contribuição ao PIB do Brasil, mas como 23% dos insumos dos fertilizantes vêm da Rússia, a guerra está prejudicando muito o setor”, disse o deputado.
Dependência
Na busca por soluções, governo e CNA defenderam a aprovação de propostas que tratam do Programa de Desenvolvimento da Indústria de Fertilizantes (PL 3507/21) e da regulamentação dos bioinsumos (PL 658/21), ambas em análise na Câmara. O presidente do Comitê Gestor de Nutrientes da Embrapa, Vinícius Benites, não vê solução imediata.
“O Brasil depende e dependerá, por muito tempo, da importação de fertilizantes. O problema dos fertilizantes no Brasil é estrutural, geológico: as nossas fontes de fósforo e potássio não são suficientes para suprir a nossa demanda”, explicou.
Segundo Benites, o Brasil pode aproveitar a crise para investir em novas tecnologias, algumas delas já em análise na Rede FertBrasil, como redução da quantidade de adubação, aproveitamento de pastagens degradadas (sistema de integração lavoura-pecuária), nutrientes organominerais e o uso de resíduos orgânicos. “O que existe de potássio em dejetos de suínos e aves é mais do que a (atual) produção nacional de potássio”.
A diretora de biológicos da Croplife Brasil, Amalia Borsari, mostrou avanços na produção de fertilizantes de base animal, vegetal e microbiana. São produtos que permitem maior absorção de nutrientes, redução da dose de fertilizante e até substituição de fertilizantes, sobretudo os nitrogenados. O setor cresce a taxa anual de 8% a 11% e o faturamento global é de cerca US$ 1,2 bilhões.
Mineração
A Agência Nacional de Mineração (ANM) analisa hoje 381 processos relativos à produção de potássio no Brasil, sendo 284 autorizações de pesquisa, 16 requerimentos de lavra, 9 concessões de lavra e 72 requerimentos de pesquisa. Algumas áreas de lavra estão na região de Autazes, no Amazonas, em região ambientalmente frágil e próxima a terras indígenas delimitadas.
O superintendente de pesquisa da ANM, Ricardo Parahyba, disse que, mesmo em caso de liberação da licença, ainda haverá muito tempo até a efetiva produção. Os debatedores defenderam mais investimento no Serviço Geológico do Brasil (CPRM) a fim de ampliar o mapeamento do subsolo do País.