Participantes de sessão solene em homenagem ao Dia do Orgulho LGBTQIA+ cobraram a aprovação, pelos parlamentares, de propostas garantindo direitos a essa população. A sessão ocorreu no Plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (28).
Um dos deputados que pediu a sessão, David Miranda (PDT-RJ) destacou que as recentes conquistas da população LGBTQIA+ foram obtidas no Supremo Tribunal Federal (STF) e não no Congresso Nacional. Em 2019, por exemplo, o STF criminalizou a homofobia e a transfobia no Brasil. Ele também criticou o atual governo por estimular a violência contra a comunidade LGBTQIA+.
“Nós temos um presidente [da República] que ativamente é LGBTfóbico, faz ataques a toda comunidade LGBTQIA+, inclusive a mim, à minha família e a meu marido. Eu hoje estou aqui em pé neste local que não aceita nossos corpos, nossa orientação sexual ou a nossa identidade de gênero. Estou aqui resistindo em um espaço onde somos muito poucos, onde as políticas públicas não acontecem para a nossa população”, afirmou.
Marco legal de proteção
Presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), Gustavo Miranda Coutinho reiterou que o Parlamento está em dívida com essa população, porque desde a Constituição de 1988 não aprova proposta garantindo direitos para os LGBTQIA+. Ele defende um marco legal assegurando proteção e direitos para essa população.
Coutinho destacou ainda que a violência contra essa população tem aumentado, especialmente contra as pessoas trans e negras. Segundo ele, em 2021, nove defensores de direitos humanos LGBQIA+ foram assassinados, sendo oito negros e cinco pessoas do campo. Ele considera o governo conivente com a situação, ao promover o ódio contra essa população. E chamou atenção ainda para o cenário de desmonte de instâncias de participação social no atual governo, como do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, o que afeta a população LGBTQIA+.
Situação do Brasil
Também autora do requerimento de pedido da sessão solene, a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP) acredita que é necessário repetir a revolta de Stonewall, que ocorreu em 1966 em Nova York, nos Estados Unidos, contra a violência contra a comunidade gay e que deu origem ao Dia do Orgulho LGBTQIA+.
“Hoje, no Brasil, é uma luta, uma resistência que se faz muito necessária. Porque não só somos o País que mais mata a população LGBTQIA+ do mundo, não só estamos num país em que a população trans tem a expectativa de vida de 25 anos de idade, não só vivemos numa sociedade, num mundo em que somente em 2018 a transexualidade deixou de ser considerada um CID, portanto, um transtorno, uma doença, mas principalmente porque neste momento nosso país é governado por um LGBTfóbico assumido, alguém que tem orgulho de ser preconceituoso, intolerante, violento”, disse.
Para a deputada, o atual governo autoriza, institucionaliza e estimula a violência contra essa população. “Nós vivemos em um país em que, se o presidente da República, pudesse cassaria nossos direitos”, concordou o deputado [[Professor Israel Batista]], que também pediu a sessão. Ele avalia que os direitos não estão garantidos e que há perigo concreto de serem retirados. O parlamentar frisou que é gay e que considera importante anunciar isso neste momento, por conta do cenário de retrocessos em todo o mundo, com a contestação de conquistas históricas.
Aprovação de propostas
Coordenadora Nacional da Área Jurídica da Aliança Nacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexuais (LGBTQI+), Amanda Souto também pediu que parlamentares aprovem propostas com garantias para essa população. “Nós precisamos fazer com que os bons projetos de lei que existem aqui sejam aprovados e que outros bons projetos sejam apresentados, para garantirmos a nossa cidadania. Hoje nós temos um projeto excelente, que é o Estatuto da Diversidade (PLS 134/18), que está parado na Comissão de Transparência do Senado”, citou.
Além disso, ela criticou a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que suspendeu a liminar da Justiça Federal do Acre determinando a inclusão de perguntas sobre orientação sexual e identidade de gênero nos questionários do Censo Demográfico 2022. “Essa é uma questão complicada porque o IBGE alega falta de tempo, mas os LGBTs não surgiram na semana passada, nós sempre existimos”, disse. “Nós vamos recorrer dessa decisão, nós precisamos que o censo seja realizado, porque não podemos ficar mais 10 anos sem políticas públicas para os LGBT”, informou.
Professora e integrante da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Sara Wagner York afirmou que nos últimos anos foram contabilizados “248 projetos de lei antigênero” em tramitação na Casa. Para ela, o Congresso “produz, reproduz e mantém violações ao se negar a enfrentar as dinâmicas da LGBTfobia para além desse dia”.
Propostas barradas
Já a deputada Erika Kokay (PT-DF), que também pediu a sessão, frisou que nos últimos anos parlamentares que defendem essa população conseguiram barrar propostas contra os direitos LGBTQUIA+, como o Estatuto da Família (PL 6583/13) e o Escola sem Partido (PL 7180/14), chamado pela deputada de “escola amordaçada”. Na avaliação dela, “a luta em defesa dos direitos da população LGBTQIA+ é estruturante para uma sociedade que assuma toda a sua diversidade, porque o mundo não é binário”.
Andrey Lemos, da A União Nacional LGBT, salientou a importância de se eleger mais parlamentares LGBTQIA+.
“Não é uma escolha”
Vice-presidente da Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas, Thamirys Nunes observou que é preciso mudar a concepção de que ser LGBT ou trans é uma escolha. “Não é uma escolha, as pessoas nascem assim”, afirmou. Segundo ela, mudar essa concepção é importante para que essas pessoas não sejam vistas como aberração, fruto de família desajustadas. Ela ressaltou que as políticas públicas devem abranger a infância e a adolescência, já que as pessoas LGBT e trans já chegam na idade adulta violentadas, por exemplo, pelas próprias famílias, que as expulsam de casa.
Presidente e fundadora da Associação Brasileira de Intersexos, Thaís Emília criticou, por sua vez, a falta de dados e políticas sobre pessoas intersexo, que nascem com características físicas, genéticas ou hormonais que não se enquadram nas definições biológicas típicas de masculino ou feminino. Segundo ela, não se sabe nem quantas pessoas intersexo há no País e há dificuldade de registro e acesso a documentos. Ela também denunciou a mutilação de órgãos sexuais de bebês intersexo e ressaltou que os adultos intersexo não são acolhidos pela rede de saúde.