Duas comissões permanentes da Câmara discutiram nesta quinta-feira (27) providências a serem tomadas para combater a violência nas escolas. Na Comissão de Educação, a mobilização da comunidade escolar e ações de prevenção foram apontadas como importantes. Na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle, o foco foi o papel das redes sociais no incentivo aos crimes e a necessidade de monitoração do poder público.
Autor do requerimento para a audiência, o deputado Tarcisio Motta (Psol-RJ) apontou a prevenção como palavra-chave das políticas públicas de combate à violência contra as escolas. Na Comissão de Educação, ele expressou as preocupações da sociedade diante de tantos ataques, desde 2011, na escola Tasso da Silveira em Realengo, no Rio de Janeiro, até os mais recentes, em São Paulo e Blumenau.
“Propostas que podem contribuir para solução do problema: psicólogos em escolas, detectores de metal, ronda escolar, educação crítica da mídia, gestão democrática, formação continuada, planos de prevenção. Se tem alguma coisa que nós aprendemos é que prevenir é melhor do que correr atrás do prejuízo quando ele está dado”, disse.
O professor Daniel Cara, da USP, que participou do grupo de trabalho da Educação na transição entre os governos Bolsonaro e Lula, enumerou itens de um relatório sobre o extremismo nas escolas. O diagnóstico inclui o crescimento de células neonazistas no País; a natureza machista, racista e homofóbica dos ataques; e as agressões como vingança à violência sofrida na escola; entre outras constatações.
“O que nós percebemos é que a ampla maioria dos ataques ocorre por uma mobilização gerada por um extremismo de uma cultura neonazista e fascista que precisa ser evidenciada. O Brasil tem uma grande quantidade de células neonazistas e fascistas, e essas células precisam ser debeladas, até porque desrespeitam uma lei de 1989, que é uma lei que trata dos crimes de ódio e que aborda a questão do nazismo, mas essa lei precisa inclusive ser atualizada”, ressaltou.
Mobilização
Entre as recomendações do relatório, Daniel cita a mobilização da comunidade escolar e o monitoramento da internet, que, segundo ele, já evitaram algumas tentativas de ataque. Muitos participantes do debate discordaram da colocação de guardas armados ou de equipamentos de segurança nas escolas como solução para conter a violência.
Para a secretária-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE), Fátima Silva, é preciso prestar atenção à escalada de ameaças aos profissionais de educação, com agressões verbais e o desrespeito à autoridade do professor. Ela enfatiza a importância da valorização dessa categoria.
“É impossível a gente discutir a escola e o combate à violência se nós não tivermos a valorização do profissional da Educação. Se ele não tem concurso público e tem uma relação precária, ele também tem um vínculo precário com a comunidade escolar”, ponderou.
Educação Digital
Muitos relatos destacaram a ação de aliciadores virtuais, inclusive do exterior, no incentivo à violência escolar. Representante da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do Distrito Federal, Ricardo Chagas salientou a necessidade da educação digital da família e de disciplina no uso da tecnologia no ambiente escolar.
“Falou-se muito nos pais olharem a mochila dos filhos, mas existe uma mochila, a mochila digital, que essa também precisa ser olhada todos os dias, a todo momento. A tecnologia é, sim, uma ferramenta de desenvolvimento, de facilitação do trabalho, de acesso à renda, mas quando não utilizamos da forma adequada, viramos uma nação de consumidores”, avaliou.
A audiência pública da Comissão de Educação trouxe o resultado de um monitoramento de grupos de extrema direita nas plataformas Tik Tok e Twitter, que detectou uma escalada da violência no conteúdo das publicações, com postagens incentivando novos ataques a escolas e a relação com grupos extremistas.
Fiscalização
Pesquisa sobre as redes sociais também fundamentou a audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. A pós-graduanda em Políticas Públicas Stefanny Papaiano argumenta que o isolamento social durante a pandemia de Covid-19 facilitou a entrada de estudantes em subcomunidades na internet que pregam ataques a escolas. Ela apontou a necessidade de fiscalização por parte do poder público.
Presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle, a deputada Bia Kicis (PL-DF) afirmou que os estudos apresentados na audiência pública mostram como o ambiente das redes é usado para o cometimento de delitos. Ela nega que as ações estejam ligadas à direita, mas acusa o envolvimento de grupos de extrema esquerda. A deputada também criticou o projeto de lei das fake news (PL 2630/20).
“Nós queremos evitar os crimes e nós estamos convictos de que você censurar as redes não vai ajudar a evitar esses crimes, porque já temos mecanismos para encontrar esses criminosos, mas se você impede o acesso, você vai esconder essas pessoas”, disse.
A especialista em Orientação Educacional Paula Marisa, que participou do debate, reconheceu que a situação é complexa e, por envolver a saúde mental da comunidade escolar, os problemas precisam ser detectados o quanto antes. Ela alerta, no entanto, que as redes sociais não são as únicas culpadas.
“O problema não é a internet. O problema é uma criança estar sem a supervisão do adulto. O problema é a escola não ter orientador, porque hoje nossa legislação não obriga a presença de um orientador escolar, que é quem vai cuidar dessa parte socioemocional dos alunos”, lamentou.