A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados ouviu especialistas nesta quinta-feira (26) que classificaram como uma “epidemia” o alto índice de golpes financeiros no País. Os participantes da audiência pública relataram várias falhas que têm possibilitado a prática desse golpes, como vazamento de dados bancários, baixa punição para o crime de estelionato e ausência de ação dos bancos na prevenção de fraudes com empréstimos consignados e com serviços digitais.
O coordenador da Comissão dos Direitos do Consumidor da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), Antônio Carlos Cintra, disse que o golpe de maior impacto é aquele no qual o aposentado é levado a fazer um empréstimo consignado sem saber. Uma das mentiras contadas pelos fraudadores, a chamada “engenharia social”, é a de que o segurado precisaria fazer uma prova de vida. O golpe é praticado por estelionatários e até por correspondentes bancários, segundo Cintra e o deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP).
O representante dos defensores públicos pediu a criação de uma lei nacional que proíba o empréstimo digital para pessoas idosas. Ou seja, que exija a presença física para a contratação. Segundo ele, a lei já existe em Santa Catarina e na Paraíba.
Já a presidente da Associação Brasileira dos Procons, Márcia Moro, relatou o problema dos vazamentos de dados bancários e do INSS que têm permitido aos criminosos fazer uma “engenharia social” mais eficiente.
Crime de estelionato
Tanto Cintra quanto o delegado Rogério Ferreira, da Delegacia de Defesa do Consumidor de Mato Grosso, afirmaram que o crime de estelionato tem uma baixa punição. Para Ferreira, o cartão de crédito consignado não deveria permitir o saque de recursos porque o idoso paga o mínimo, acreditando que é um empréstimo comum.
O delegado citou pesquisa da empresa de segurança Fortinet que coloca o Brasil em segundo lugar em tentativas de golpes na América Latina. Em 2022, foram 103 bilhões de tentativas, pouco mais de uma por dia para cada brasileiro.
Para a deputada Gisela Simona (União-MT), que propôs o debate na comissão, uma grande dificuldade é que o consumidor tem vários produtos bancários pré-aprovados que ele nem sabe que tem e que são uma porta aberta para os criminosos. A parlamentar defendeu a extinção do cartão de crédito consignado e a necessidade de o consumidor autorizar alguns serviços de forma presencial.
“As facilidades do mundo moderno são excelentes para uns, mas para outros só trazem problemas”, afirmou.
A coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, disse que os bancos poderiam ter uma atuação mais ativa na prevenção dos golpes. “O banco tem o algoritmo que é tão utilizado para nos oferecer produtos. Por que não é usado para ver movimentações atípicas na conta da pessoa e questioná-la previamente?”
Um relatório do Idec aponta a falta de bloqueio, por parte dos bancos, do acesso remoto de terceiros às contas bancárias. Apenas um de quatro bancos analisados fazia o bloqueio.
O diretor adjunto de Serviços da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Walter Faria, respondeu que a questão está em estudo, mas que extrapola a ação dos bancos, já que a vítima costuma permitir o acesso por meio de um link malicioso. Ele disse, no entanto, que a entidade está investindo em campanhas de conscientização e citou projeto em tramitação no Senado (PL 2254/22) que criminaliza a utilização de contas bancárias para fraudes.
O chefe de Supervisão Bancária do Banco Central, Belline Santana, disse que leu o relatório do Idec e que está questionando os bancos sobre a implantação do bloqueio. Santana sugeriu que as pessoas que forem abrir contas bancárias confiram antes o ranking de instituições mais reclamadas feito pelo BC.