A prevenção e a mitigação de mudanças climáticas são ações necessárias para amenizar deslocamentos causados por desastres naturais no Brasil, na avaliação de representantes das Nações Unidas que participaram, nesta segunda-feira (2), de audiência na Comissão Mista Permanente sobre Migrações Internacionais e Refugiados do Congresso Nacional. O colegiado é presidido pelo deputado Túlio Gadêlha (Rede-PE).
A oficial do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur Brasil) Silvia Sander afirmou que as pesquisas da entidade demonstram correlação crescente entre efeitos das mudanças climáticas e fatores de deslocamento. Segundo ela, o número de vítimas continuará crescendo com casos associados ou agravados por eventos decorrentes de mudanças climáticas.
“Ao final de 2023, 75% das pessoas deslocadas internamente estão em países altamente vulneráveis às mudanças climáticas. Conforme dados do Banco Mundial, até 2050, estima-se que mais de 17 milhões de pessoas se deslocarão dentro dos seus próprios países na América Latina, devido a questões relacionadas às mudanças climáticas”, afirmou Silvia Sander.
Enchentes no RS
O senador Paulo Paim (PT-RS) apontou as enchentes no Rio Grande do Sul no primeiro semestre como exemplo de um novo perfil nas migrações que ocorrem dentro do território nacional. Segundo o governo gaúcho, até 20 de agosto havia quase R$ 2,4 milhões de afetados e 183 óbitos.
“A maior catástrofe natural da história do país provocará, pela primeira vez, deslocamentos internos em massa por efeitos climáticos”, afirmou Paim. “Ao longo dos anos, o deslocamento interno no Brasil foi motivado principalmente por fatores econômicos. Porém, calamidades humanas e naturais têm assumido o protagonismo nesse processo”, avaliou.
Paim é autor de projeto de lei que cria a Política Nacional para Deslocados Internos, com o propósito de assegurar direitos — como não discriminação, saúde e liberdade de locomoção — de residentes brasileiros que se veem obrigados a mudar em razão de calamidade, de violação de direitos ou de violência armada. A proposta precisa ser aprovada pela Senado e, depois, pela Câmara.
Medidas conjuntas
A relatora especial sobre direitos humanos das Nações Unidas sobre deslocados internos, Paula Gaviria Betancur, defendeu que a resposta aos deslocamentos venha de políticas públicas que enfrentem os diversos fatores subjacentes, como a mitigação das mudanças climáticas, aumento da coesão social e fortalecimento de mecanismos locais de resolução de conflitos.
Na avaliação do consultor do Senado Tarciso Dal Maso Jardim, todas as unidades da Federação devem colaborar com medidas para regresso, realocação e reintegração dos deslocados internos. “Quando há uma massa de deslocamento de pessoas, o primeiro ponto de chegada muitas vezes não tem condição de dar conta do padrão mínimo de dignidade que essas pessoas merecem”, afirmou.
Famílias
A representante do Ministério da Justiça Carolina Morishita Mota Ferreira entende que indenizar em dinheiro é insuficiente para reparar os danos causados pelos acidentes. Para ela, as autoridades públicas devem prestar auxílios de modo amplo, como a rápida reunificação. “O mais automático é a gente pensar na perda da residência, mas existe uma perda dos vínculos afetivos e da rede de apoio”, afirmou.
Ela citou o exemplo dos deslocamentos ocorridos em Maceió (AL) após 2018, em decorrência do afundamento do solo em bairros por conta da exploração mineral do sal-gema. “As famílias não foram realocadas conjuntamente. Foram espalhadas por diferentes bairros e, com isso, as mães que deixavam seus filhos com uma vizinha, uma familiar de confiança, precisariam se deslocar por toda uma cidade para ter esse apoio. Isso afeta especialmente as mulheres”, pontuou.
A Política Nacional para Deslocados Internos prevê que todos os deslocados internos têm o direito de conhecer o destino e o paradeiro dos seus familiares desaparecidos e que as autoridades devem esforçar-se para localizar o destino dos desaparecidos e informar os familiares sobre os resultados das buscas.