Servidores públicos em greve da Agência Nacional de Mineração (ANM) aproveitaram um seminário promovido pela Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados para reivindicar a reestruturação do órgão, criado em 2017. A paralisação geral termina nesta quinta-feira (29), quando serão retomados apenas os serviços considerados essenciais, como a segurança de barragens.
Durante o debate sobre os impactos da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cefem) no desenvolvimento dos municípios, o superintendente substituto de Arrecadação e Fiscalização de Receitas da agência, Rui Giordani, pontuou que atualmente 85% da cota parte da Cefem que é direcionada à ANM vem sendo contingenciada.
Ele ressaltou que a contribuição, conhecida como royalties da mineração, é atualmente uma das principais fontes orçamentárias de municípios mineradores, mas acaba subaproveitada por deficiências estruturais da agência.
“Imagine se a ANM possuísse estrutura, orçamento, remuneração e tivesse acesso à base de dados da Receita Federal. Será que não estaríamos em outro patamar em relação à arrecadação da Cefem?”, questionou.
Fiscalização
De acordo com Giordani, em 2022, o valor da produção mineral no Brasil alcançou R$ 250 bilhões, gerando uma arrecadação de R$ 7 bilhões por meio da Cefem. No entanto, acrescenta ele, a cada 1000 empresas que recolheram a contribuição, apenas uma foi fiscalizada.
Segundo a Lei 13.540/17, que regulamenta a Cefem, 60% dos recursos arrecadados vão para municípios onde ocorreu a exploração mineral, 15% para municípios afetados pela atividade (ferrovia, mineroduto, porto, estrutura de mineração), 15% para o estado produtor e 10% para a União (7% para a ANM; 1% para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT); 1,8% para o Centro de Tecnologia Mineral (Cetem); e 0,2% para o Ibama).
O deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), que integra a Frente Parlamentar da Mineração Sustentável e propôs o seminário, afirmou que a sustentabilidade na mineração depende de uma ANM estruturada.
“Nós sabemos que sem uma agência nacional de mineração com profissionais valorizados, tecnologia moderna, não teremos uma mineração forte e sustentável”, disse.
Ouvidor da ANM, André Marques destacou que os repasses da Cefem estão prejudicados não porque os servidores estão em greve, mas porque as condições da ANM levaram os servidores a estarem em greve. “Essa Cefem que nunca chegou integralmente no seu 7% para a ANM é o que nos atrapalha sobremaneira para que a gente possa desenvolver os nossos sistemas, capacitar as nossas equipes e estruturar a nossa casa”, lamentou Marques.
Dependência de Recursos
Pesquisador do Cetem, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, Fábio Britto apresentou dados de um estudo com os 30 municípios que mais receberam Cefem nos últimos anos.
“Uma amostra com 21 desses 30 municípios estudados revela que 1/3 deles (7 municípios) tem mais de 30% do orçamento vindo da Cefem. Isso pode representar um cenário positivo se convertido em politicas públicas, mas também envolve um risco, que é a dependência desses recursos”, disse Britto.
Um dos desafios dos municípios, segundo ele, recai sobre a capacidade de planejamento, dada a dificuldade de previsão da receita originada pela Cefem. Ele afirmou que, em muitos casos, os municípios se planejam para um volume menor de recursos e acabam aproveitando mal o que é de fato repassado.
Base Econômica
Professor de direito financeiro da USP, Fernando Facury defendeu a necessidade de os municípios fazerem um melhor uso da Cefem. “A Cefem deve ser usada estritamente a despesas de capital para modificar a base econômica dos entes federados. Em vez de deixa no caixa único do município, a ideia é vincular os recursos a efetiva modificação da base produtiva dos entes preparando-os para o esgotamento dos recursos”, disse.
Prevista na Constituição Federal, a Cefem é paga a estados, Distrito Federal, municípios e a órgãos da administração da União por empresas que exploram recursos minerais em seus respectivos territórios.