Seminário realizado na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (23) discutiu e recolheu sugestões para democratização do Orçamento da União, com eventuais impactos em leis correlatas dos estados e municípios. Entre outros pontos, houve críticas à falta de transparência nas atuais emendas de relator-geral, as chamadas RP 9.
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O debate foi proposto pelo deputado Pedro Uczai (PT-SC), presidente da Comissão de Legislação Participativa. Ele declarou que, com base nas duas reuniões de debates de hoje, deverá consolidar os temas em um livro, a ser entregue em fevereiro ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.
“O Orçamento da União está cada vez mais concentrado, e a participação popular é fundamental para o fortalecimento da democracia e para o combate às desigualdades sociais”, escreveu Uczai, ao defender a realização do seminário.
Ex-ministro na gestão Dilma Rousseff e ex-chefe de gabinete de Lula, o filósofo Gilberto Carvalho citou a participação popular naqueles governos, apontando a prática como uma conquista da sociedade. “Deve ser um processo pedagógico e de conscientização, caso contrário há risco de continuar enxugando gelo”, disse.
Carvalho defendeu a realização de campanha pública com o objetivo de divulgar, de maneira acessível, as possibilidades de participação popular em conselhos e outras instâncias. “Isso não é doutrinação, é informação”, afirmou. Essa mesma estratégia, segundo ele, deveria ser adotada em relação às finanças públicas.
Na campanha deste ano, Lula anunciou para seu terceiro mandado a participação popular na formulação do Orçamento. “Agora, com a internet, vamos fazer o orçamento participativo”, disse, referindo-se a modelo adotado em gestões do PT em municípios e no Rio Grande do Sul, no governo Olívio Dutra (1999-2003).
Participação e consulta
Logo no início dos debates, o cientista político Rudá Ricci, presidente do Instituto Cultiva, ressaltou que, para os estudiosos do tema, participação popular difere de consulta pública. “Na participação popular, o centro de decisão é o cidadão; na consulta pública, a decisão cabe a quem convocou os participantes”, esclareceu.
Ao falar do Orçamento, Ricci sugeriu a revisão da ideia de responsabilidade fiscal. “É preciso repensá-la porque o Brasil é o sétimo mais desigual do mundo”, disse. “A Lei de Responsabilidade Fiscal deve ser revisada a partir da responsabilidade social”, continuou, citando proposta já em tramitação na Câmara (PLP 246/07).
Professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e servidor da Prefeitura de São Paulo, o sociólogo Felix Ramon Sanchez disse que a nova gestão precisa cumprir promessas de campanha com foco no combate a desigualdades sociais. “E a participação popular poderá fornecer as bases para isso”, analisou.
A assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) Carmela Zigoni alertou que, hoje, a menor presença das mulheres e das pessoas negras no Poder Legislativo afeta as políticas públicas previstas no Orçamento de todos os entes federativos, resultando em desigualdades, injustiças e violação de direitos.
“De 2002 a 2015, houve avanços no combate à violência contra a mulher, mas desde então foram radicais os cortes orçamentários”, disse Zigoni, ao apresentar exemplos recentes. As emendas parlamentares destinadas a quilombolas foram 132 (0,37% do total) na Câmara entre 2015 e 2019; no Senado, apenas 1 (0,02%).
Os deputados Padre João (PT-MG), 1º vice-presidente da Comissão de Legislação Participativa, Henrique Fontana (PT-RS), Patrus Ananias (PT-MG) e Erika Kokay (PT-DF) coordenaram partes do seminário. “O povo precisa estar no Orçamento, e os ricos no Imposto de Renda”, afirmou Bohn Gass (PT-RS), um dos participantes.